Mais de 150 milhões de mulheres e meninas foram submetidas a mutilação genital feminina em todo o mundo. Segundo o Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância), cerca de três milhões de meninas se tornam vÃtimas dessa prática a cada ano.
Por ocasião do Dia Internacional contra a Mutilação Genital Feminina, 6 de fevereiro, foi lançada em Berlim uma campanha contra esse tipo de violência contra a mulher. A mentora da iniciativa lançada por diversas organizações é a ex-modelo Waris Dirie, ela própria mutilada na idade de 5 anos em seu paÃs de origem, a Somália.
Waris Dirie denuncia que os polÃticos em todo o mundo, não só na Europa, só fazem promessas vazias. Como encarregada especial das Nações Unidas, ela exige medidas concretas: “É um problema mundial, não apenas africano. Acontece em todo o mundo, e com uma frequência muito maior do que se imagina. É chocante e decepcionante ver os polÃticos internacionais se omitindo dessa forma”.
Não só na Ãfrica e nos paÃses árabes
As principais vÃtimas da mutilação genital são sobretudo meninas e mulheres de 28 paÃses africanos, sobretudo ao sul do Saara. Fora da Ãfrica, essa prática é comum principalmente em paÃses árabes como Omã e Iêmen. Na Europa e na América do Norte, os imigrantes muitas vezes viajam para seus paÃses de origem para mandar mutilar suas filhas.
A meta da campanha é alertar para esse grave problema mundial por meio de uma propaganda provocadora.
A organização de defesa dos direitos da mulher Terre des Femmes se empenha desde 1983 contra a mutilação de mulheres, sobretudo na Ãfrica. A polÃtica verde alemã Irmingard Schewe-Gerigk, presidente da organização, descreve a resistência contra esse crime: “Em Burkina-Faso, por exemplo, 300 voluntárias combatem a mutilação genital feminina com nosso incentivo e apoio financeiro. Essas mulheres visitam vilarejos e informam a população sobre as consequências nocivas dessa prática”. Até agora, 32 mil meninas puderam ser protegidas da mutilação em consequência desse trabalho voluntário.
A Terre des Femmes também atua em Serra Leoa, onde as mulheres anteriormente incumbidas de realizar a mutilação adquirem chances de mudar de profissão com ofertas de alfabetização, cursos de agricultura ou indenização financeira.
A associação LebKom e.V. (uma sigla que quer dizer “comunicação viva com mulheres em sua própria cultura”) desenvolve projetos no Quênia, a fim de proteger as meninas, fortalecer as mulheres e mobilizar os homens. Na opinião de Kerstin Hesse, atuante há sete anos no Quênia, a mutilação genital feminina só pode ser combatida se todos estiverem envolvidos no processo. Afinal, não adianta uma mulher decidir que não mandará mutilar sua filha, se o resto da famÃlia for contra essa decisão.
“Já que no Quênia, assim como no mundo inteiro, são os homens que decidem e determinam as regras dentro da famÃlia e na sociedade, nós nos concentramos sobretudo no trabalho com os homens. Oferecemos cursos para 210 docentes, 50% homens e 50% mulheres. Esses cursos foram concebidos para durar três anos e meio. No inÃcio do projeto, em 2002, a maioria dos professores matriculados eram defensores radicais da mutilação feminina, uma frente masculina disposta a defender sua cultura”, descreve Hesse.
Entretanto, os profissionais responsáveis pelos cursos se mostraram aptos a lidar com essa reação completamente compreensÃvel dos participantes. Após apenas três meses de curso, homens e mulheres estavam decididos a proteger suas filhas da mutilação. Os participantes acharam tão enriquecedor o que aprenderam nos cursos que se entusiasmaram em dividir esse conhecimento com a maior quantidade possÃvel de pessoas, lembra a polÃtica verde alemã e presidente da Terre des Femmes.
Perpectiva de mudar o código penal alemão
Segundo Irmingard Schewe-Gerigk, na Alemanha vivem 20 mil mulheres mutiladas, sendo que 5 mil meninas correm o risco de serem submetidas à mutilação. “Eu gostaria que essas meninas fossem colocadas sob nossa proteção. Temos que fazer tudo para impedir que elas não sejam mutiladas na Alemanha ou durante alguma viagem de férias ao paÃs de origem dos pais”.
Além disso, as mulheres afetadas teriam direito a assistência médica. Nesse ponto, a Alemanha não oferece as melhores condições, alerta a polÃtica verde. É por isso que a Terre des Femmes iniciou uma campanha de assinaturas em colaboração com o centro de planejamento familiar Balance, a fim de assegurar que as vÃtimas realmente obtenham financiamento para serem examinadas, orientadas e operadas.
Por ocasião do Dia Internacional contra a Mutilação Genital Feminina, polÃticos alemães fizeram um apelo pelo repúdio dessa prática em todo o mundo.
Na Alemanha, uma mudança na legislação sobre o tema está sendo levada adiante. Os estados de Baden-Württemberg e de Hessen já apresentaram ao Bundesrat, câmara alta do Parlamento alemão, um projeto de lei que prevê uma pena de prisão de pelo menos dois anos para casos de mutilação genital.
Até agora, essa prática era punida apenas como lesão corporal simples ou culposa. Diversos estados com governos conservadores já demonstraram apoio ao projeto de lei.
Essa postura é nova. Em julho de 2009, as bancadas cristãs ainda defendiam as atuais regulamentações penais, considerando um maior rigor legal contraproducente para as vÃtimas.
Autora: Sabine Ripperger (sl)
Revisão: Alexandre Schossler