Por Cláudia Collucci, da Folha SP
“A indústria da bebida alcoólica está investindo mais em propagandas dirigidas a adolescentes do que nas voltadas a adultos. A conclusão é de um estudo publicado neste mês no ‘Journal of Adolescent Health’, que avaliou, durante cinco anos, 13.513 campanhas de bebidas em 118 revistas americanas.
Apesar de o trabalho ter sido feito nos EUA, há indÃcios de que a tendência é a mesma no Brasil. Pesquisa da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) mostra que o adolescente se identifica com elementos da propaganda de cerveja -cores, gente jovem e bonita.
Outro estudo da Unifesp ainda não concluÃdo mostra que há muita propaganda de bebida na TV sendo veiculada à tarde, quando a maior audiência é do público infantojuvenil.
O Conar (Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária) informou que desconhece essa informação e que não tem acesso às pesquisas da Unifesp e suas metodologias.
‘A indústria do álcool está nos enganando. Ao contrário do seu posicionamento público [de que não há publicidade dirigida a menores de idade], eles estão mirando nos jovens por meio da sua propaganda. Eles estão dizendo uma coisa e fazendo outra’, disse à Folha Michael Siegel, professor de ciências da saúde da Boston University e coautor do estudo.
Segundo os pesquisadores, as propagandas de bebidas usualmente consumidas por jovens (como cerveja premium beer ou de baixa caloria, rum e vodca) apareceram quatro vezes mais em revistas voltadas para jovens em comparação à s bebidas mais consumidas por adultos (como uÃsque e gim).
Segundo a pesquisadora Ilana Pinsky, professora da Unifesp, as normas de autorregulamentação brasileiras são frequentemente burladas pela indústria no que diz respeito à propaganda de cerveja. ‘Embora ela não fale do produto em si, aborda os sonhos e o estilo de vida relacionado às pessoas jovens e bonitas, às festas, que tudo tem a ver com o jovem.’
Segundo o Conar, todos os possÃveis abusos nas propagandas de cerveja são investigados. No ano passado, mais de cem processos éticos foram abertos, informou o conselho.
Procurado pela Folha, o Sindicerv (sindicato nacional das indústrias de cerveja) não quis comentar as pesquisas.
Para Pinsky, a propaganda é um dos elementos que leva o jovem a um inÃcio mais precoce do consumo de bebida. Uma pesquisa do Cratod (Centro de Referência de Ãlcool, Tabaco e Outras Drogas de São Paulo) mostra que quanto mais cedo se começa a beber, maiores as chances de se tornar viciado.
Na opinião de Arthur Guerra, presidente do Centro de Informações sobre Saúde e Ãlcool, não há evidências cientÃficas sólidas de que a propaganda esteja induzindo os jovens a beberem mais ou precocemente. ‘A propaganda de bebida usa pessoas jovens e bonitas assim como a de sabonete e a de sandálias Havaianas. O jovem vai beber com ou sem propaganda. É claro que ela influencia, mas creio que a decisão de beber não esteja ligada à propagada.’”