Todos os problemas globais estão parados: a reforma financeira, a mudança climática, o comércio mundial. Enquanto a Europa se afunda, não há consenso sobre as causas da crise financeira ou as reformas para evitar-lhe a repetição. Impotente, o G20 resvala para a irrelevância das instituições que deveria substituir.
[FSP, 16 abr 12] O aquecimento global e as negociações comerciais padecem de mal igual: ausência de consenso, falta de vontade polÃtica, paralisia do processo negociador. O que está acontecendo? Todo poder tende a gerar uma determinada ordem. EstarÃamos, como comentava Celso Lafer anos atrás, ante situação de desconexão entre o poder existente e a ordem desejada?
Autores como Robert Gilpin afirmam que a ordem econômica “liberal” – livre-comércio, garantia de investimentos e empréstimos – depende da “estabilidade hegemônica”. Isto é, precisa de um poder estável -a Inglaterra vitoriana no século 19, os EUA a seguir- para ser imposta.
É grande a tentação de atribuir o vácuo de liderança ao declÃnio do poder americano e à relutância da China de assumir responsabilidades. Será? Ou, mais do que mudanças de efeitos imprevisÃveis, o que convém a americanos e chineses é o status quo?
A segunda hipótese se cola melhor à lição de Maquiavel sobre a dificuldade de criar uma ordem nova. Pois os partidários da inovação são tépidos, lembrava o secretário florentino, ao passo que os beneficiários da velha ordem a combatem com o ardor dos ameaçados de pagar o custo da mudança.
Surpreende acaso que os dois maiores adversários de compromissos contra o aquecimento global sejam os principais beneficiários do produtivismo predatório? Algo similar pode ser dito sobre as finanças ou o comércio.
Quando se trata de enfrentar ameaças a interesses vitais de segurança, reais ou percebidas, não há paralisia alguma.Saddam Hussein e Osama bin Laden que o digam. Iraque, Afeganistão, LÃbia mostram que o poder americano é capaz de agir com decisão. Se numa segunda etapa a solução cria problema novo (como o reforço do Irã), isso não invalida a tese.
Os EUA se aprestam a redirecionar para o mar da China o centro de gravidade de sua estratégia. Já armaram ao redor da China um arco de contenção, que vai do Japão no norte à Austrália no sul. Não é indÃcio de paralisia ou fraqueza.
Na América Latina, congelaram Cuba, hoje em transição gerontocrática. Liquidada a guerrilha centro-americana, com aColômbia reforçada e Chávez enfermo, por que deveriam os americanos dar atenção estratégica ao continente?
Mais do que livre escolha, a ordem polÃtico-econômica de 1945 foi imposição da destruição da velha ordem pela guerra. Aureolados pela vitória contra o Eixo e pela superação da Grande Depressão, os americanos dispunham do poder e da liderança moral e cultural para construir a ordem.
Agora, divididos dentro do paÃs, desprestigiados fora pela crise financeira, duvidosos de que nova ordem lhes traga as vantagens da antiga, o natural é que usem o poder para eliminar os inimigos restantes (SÃria, Irã) e manter as coisas como estão.
O nome disso é paralisia.
Parece que dos americanos o único poder que lhes resta ainda é o fundamentalismo cristão. Realmente, com este poder, não dá pra fazer muita coisa pelas demandas globais mais urgentes. Bem é possÃvel que eu tenha exagerado, mas devo ter chegado muito perto, não? rs
Mas, se ao menos em nossas comunidades, por menor que elas sejam, estivermos contribuindo com nossos conta-gotas, já será útil. Afinal, num mundo globalizado como o nosso, certamente surtirá algum efeito, ainda que muito pequeno. Somos, enquanto comunidades do Reino de Deus, poderosos centros educacionais capazes de transformar mentalidades.