[Judith Newman, NYT/FolhaSP, 4 nov 11] Mary Lou DiNardo checou três vezes antes de ter certeza: será que aquilo era um emoticon de sorriso no final do último e-mail de seu cliente mais rÃspido?
Executivo da imobiliária West Coast, ele concluiu o MBA de uma importante universidade e era “um homem muito intelectualizado e sério”, disse DiNardo, presidente da TK/PR, uma empresa de relações públicas.
“Eu tenho trabalhado com ele durante sete anos. De repente, enquanto nós estávamos discutindo alguns problemas com um vendedor, ele se despediu com um desses emoticons sorrindo ou piscando. Na verdade, não me lembro de tê-lo visto, alguma vez, com um sorriso em seu rosto real.”
DiNardo integra a fileira de profissionais que se encontra entre os receptores de sorrisos, piscadelas e hahahas, conforme os emoticons migram inesperadamente dos e-mails e textos de adolescentes (e, talvez, de adultos mais frÃvolos) para as correspondências de empresários que se orgulham de sua seriedade.
“Não há dúvidas de que os tenho enviado e recebido com mais frequência”, afirmou Martha Heller, presidente da Heller Search Associates, uma empresa de recrutamento de executivos do setor de tecnologia das 500 empresas listadas pela revista “Fortune”.
“Geralmente, eu uso um emoticon sorrindo ou piscando quando quero sinalizar que o meu comentário tem a intenção de ser irônico. Por exemplo, eu contratei um rapaz que é gerente de vendas e marketing para lançar minha empresa no maravilhoso mundo das redes sociais, e lhe enviei um aviso –‘Eu ouvi dizer que existe algo chamado Twitter’– e adicionei o emoticon para que ele soubesse que não estou tão desinformada assim.”
Lisa M. Bates, professora-assistente de epidemiologia da Universidade Columbia, tem adotado ultimamente o emoticon –assim como suas colegas da universidade, “mas de modo moderado e estratégico”, disse ela. “Basicamente, eu costumo ser sarcástica e apressada, e um emoticon de sorriso bem empregado é capaz de anular o tom áspero e evitar mal-entendidos”, afirmou Bates por e-mail. “Eu acredito que eles me salvaram muitas vezes do risco de ser mal-interpretada.”
SINAIS TROCADOS
No entanto, os emoticons podem gerar outros problemas: eles não são lidos da mesma forma nas diferentes interfaces. “Na função de texto do meu BlackBerry, há um menu lateral de emoticons (o quão ridÃculo é isso?) que mostra caras amarelas sorrindo mas, também, chorando e esbravejando ou piscando e assoprando beijos, etc”, afirmou Bates.
“Eu enviei uma imagem relativamente nova, um emoticon de ‘grande abraço’ –que, para deixar registrado, foi irônico. Mas, de algum modo, ele apareceu em formato de sÃmbolos no iPhone de um colega, sem cara de sorriso, e sem lembrar nem um pouco um grande abraço. A partir da perspectiva dele, aquilo se parecia, digamos, com uma imagem de partes femininas chanfradas: ({}). Ele, então, circulou pelo laboratório mostrando animadamente aos colegas o que eu havia acabado de lhe enviar. Metade das pessoas (na maioria homens) concordou com a sua interpretação, e a outra (principalmente mulheres) discordou e, provavelmente, achou que ele fosse uma espécie de pervertido desesperado.”
À parte essas interpretações errôneas, novos adeptos como Bates e Heller disseram que os emoticons não apenas sinalizam intenção em um meio onde é notoriamente difÃcil ler o tom da mensagem mas, também, denotam uma relação especial e agradável entre remetente e destinatário. “Eu vejo isso como um exercÃcio de construção de relacionamentos”, afirmou Heller.
Estudiosos de comunicação digital veem a emergente aprovação de significantes excêntricos como algo inevitável mas nem sempre desejável. “Eles fazem parte da degradação das habilidades da escrita –gramática, sintaxe, estrutura de orações e, até mesmo, caligrafia– que acompanham a tecnologia digital”, disse Bill Lancaster, professor de comunicação da Universidade Northeastern em Boston. “Certamente, eu entendo a necessidade de clareza. Mas a linguagem, usada apropriadamente, é clara por si só.”
Talvez não seja surpreendente, então, que escritores e professores de redação estejam entre os últimos a resistirem aos emoticons. “Eu me sinto profundamente ofendido por eles”, disse Maria McErlane, jornalista, atriz e apresentadora britânica do programa Radio 2 da BBC.
“Se alguém no Facebook me envia uma mensagem com uma cara sorridente-carrancuda ou um pequeno pôr do sol usando óculos escuros, eu desfaço a amizade. E também desfaço a amizade por causa de hahahas e kkks. Não tem segunda chance. Acho que isso é preguiça. As suas palavras não são suficientes? Usar uma pequena imagem com óculos escuros para que eu saiba como você está se sentindo é mais do que ridÃculo.”
Michele Farinet, coordenadora de uma escola em Manhattan, que passa grande parte de seus dias respondendo a e-mails de pais de alunos (majoritariamente profissionais), também é severamente crÃtica. Todo esse assunto toca em um ponto nevrálgico.
“Para mim, é como um filme malfeito em que, logo que o pai agarra o cachorrinho, a câmera imediatamente focaliza a expressão lastimosa do filho – como se o diretor não acreditasse que o espectador fosse capaz de sentir por si próprio uma emoção condizente com a cena”, afirmou Farinet por e-mail. “É isso que os emoticons fazem. Por favor, não me ‘mostre’ que eu deveria estar com uma cara alegre ou triste ou que você está com uma cara triste ou alegre.
“Você seria capaz de imaginar a leitura do final de ‘O Grande Gatsby’ dessa forma? ‘Então partimos, barcos contra a corrente, levados incessantemente de volta para o passado :-(‘”
Tradução de FABIANO FLEURY DE SOUZA CAMPOS