Por que o povo brasileiro teria saudades de um invasor? É com essa pergunta que a diretora Monica Schmiedt dá inÃcio ao documentário “Doce Brasil Holandês”, em que investiga o legado e o contorno mitológico dos 24 anos de dominação holandesa no Nordeste do Brasil, de 1630 a 1654.
“Sempre achei MaurÃcio de Nassau um personagem muito interessante, assim como a ideia de uma nostalgia nassoviana”, diz a cineasta, citando expressão criada pelo pesquisador Evaldo Cabral de Mello para designar a saudade do progresso e da cidadania que os anos de governo Nassau inspiravam.
Para isso, Schmiedt entrevista historiadores especialistas na invasão holandesa e alguns dos mais de mil recifenses que carregam como sobrenome uma versão brasileira da herança daquele tempo: os Vanderlei, descendentes dos Van Der Ley.
Nessa linha, o filme reúne duas historiadoras que dividem essa ascendência: a brasileira Kalina Vanderlei e a alemã Sabrina Van Der Ley. Juntas, elas exploram o que um dia foi a Mauritsstadt, ou simplesmente MaurÃcia, no coração do Recife antigo. Uma cidade planejada que exibia a maior ponte do novo mundo. Elas debatem questões de urbanismo e de identidade que emanam do cruzamento entre Brasil e Holanda.
Entre relatos e debates, “Doce Brasil Holandês” aponta o mito para então desconstruÃ-lo, sem negar os méritos reais da ocupação. Apesar de imprimir na capital pernambucana um projeto humanista de cidade, Nassau não era um diplomata do governo da Holanda, mas um funcionário da Companhia das Ãndicas Ocidentais. Como bom comerciante, se cercou de eficiente projeto de marketing.
Cores e tipos brasileiros
Nassau promoveu o maior projeto de registro iconográfico do Brasil-Colônia, colocando as cores e os tipos brasileiros no mapa dos europeus a partir do traçado dos pintores Franz Post e Albert Eckhout. O legado artÃstico e urbanÃstico da invasão vai de encontro a um suposto complexo de inferioridade do brasileiro, fomentando o pensamento de que o Brasil seria um paÃs melhor se os holandeses tivessem aqui ficado.
“Ao resgatar um passado glorioso, e mostrar que ele não foi tão glorioso assim, quero contribuir para que a gente mereça a nossa história e repense a maneira como temos tratado as nossas cidades”, diz Schmiedt. A tal “nostalgia nassoviana” desaba quando o filme aponta para as ex-colônias da Holanda. O subdesenvolvimento do Suriname e o fantasma do apartheid que insiste em assombrar a Ãfrica do Sul mostram que a expulsão dos holandeses do Nordeste, em 1654, foi um bom negócio para o Brasil.
DOCE BRASIL HOLANDÊS
Direção: Monica Schmiedt
Quando: amanhã, às 20h, e sábado (17) no IMS, no Rio de Janeiro; quarta (14) no Ponto Cine, no Rio, e no Reserva Cultural, em São Paulo; quinta (15) no Cine Santa, no Rio
Classificação: 14 anos
Fonte: Folha Online, 12 abr 2010
Por Fernanda Mena