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O Pai José ~ por José Roberto Prado

Por uma série de razões culturais e religiosas, muito já foi escrito e reverberado acerca de Maria, mãe de Jesus de Nazaré. Por outro lado, é digno de nota e até mesmo constrangedor observar o silêncio histórico acerca daquele que desempenhou o papel de “pai”: José. Sejamos coerentes; busquemos justiça: a história de Jesus não foi escrita somente pelas mãos do Espírito Santo e de Maria.

Houve um homem presente, um pai humano, que abraçou, acolheu, ensinou. Sua presença é discreta no relato dos Evangelhos, é verdade, mas nem por isso deixou de ter impacto na vida do filho. José compreendeu tão bem e foi tão pleno em desenvolver o papel que recebera de Deus que, deixando as luzes brilharem sobre o personagem principal – o Filho – engrandeceu e honrou a autor da vida e da História.

José adotou. Abençoou. Protegeu. Amou.

Por isso quero falar de José, o pai José.

Em primeiro lugar, verdadeiros pais são, também, maridos de verdade.

Honram, protegem, amam, respeitam…

Poderia passar despercebido, mas as Escrituras registram. Mateus diz que José “não querendo expô-la (Maria) à desonra pública, pretendia anular o casamento”. Ele pensou primeiro na reputação dela, ao invés do que os outros iriam falar dele!

É na vida compartilhada do casal, onde o bem estar da esposa tem prioridade, que os futuros pais aprendem (ou não) a amar. Semeado na noite e regado durante o dia, este amor ágape floresce no trato cotidiano da esposa e frutifica na saúde emocional e espiritual dos filhos. Antes de sermos pais abençoadores, precisamos aprender a ser maridos acolhedores.

É por isso que, no plano sábio e perfeito de Deus, filhos vêm depois do casamento.

José amou Maria com amor ágape. O amor que procede de Deus e que “tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta” (1Co 13.7). Demonstrou esse tipo de amor quando aceitou a noiva grávida que Deus lhe havia dado.

José foi cuidadosamente escolhido por Deus para acolher Maria.

José, filho de Eli (Lc 3.23), descendente de Davi, de Nazaré, o carpinteiro, pai adotivo de Jesus, é descrito como um homem justo (Mt 1.19).

Na linguagem bíblica, “justo” é alguém que anda retamente diante de Deus, que procura honrar o Senhor em todas as áreas da vida. Noé foi o primeiro a ser chamado justo. Ele era “justo e íntegro em seus caminhos; ele andava com Deus” (Gn 6.9).

Em outras palavras: quem seguisse suas pegadas encontraria Deus. Assim era José. Ele era íntegro, “justo” em seu coração, em sua intimidade. Nela, cultivava a Lei de Deus, o caráter, o amor e a graça do amoroso Pai.

Esta influência abençoadora e formadora de José na vida de Jesus pode ser vista no fato de que este, no início do seu ministério, quando retorna à cidade onde crescera – Nazaré, na Galiléia – é chamado de “o carpinteiro” (Mc 6.3), mesma profissão de seu pai, José (Mt 13.55).

Os estudiosos entendem que, em algum momento da vida de Jesus, entre a juventude e o início de seu ministério, aos trinta anos, seu pai José faleceu. Isto explica sua ausência nos relatos dos Evangelhos que focam essencialmente a vida adulta de Jesus.

Contudo, José conviveu tempo suficiente para moldar o caráter do filho e deixar-lhe de herança uma profissão e, mais importante ainda, um nome honrado.

José foi cuidadosamente escolhido por Deus para adotar Jesus.

Nós, homens modernos, céticos, tecnológicos, racionais, precisamos aprender com José a criar nossos filhos nos sábios, belos e muitas vezes inescrutáveis caminhos de Deus. Precisamos aprender a ser sensíveis à voz de Deus, discernindo os seus propósitos. Precisamos estar abertos e conscientes dos inexplicáveis e surpreendentes caminhos da graça de Deus na vida dos nossos filhos. Cabe a nós, como pais, orar para que estes sobrenaturais e maravilhosos caminhos de Deus possam ser encontrados pelos nossos filhos. Que a graça os alcance, encontrando seus corações, assim como nós fomos encontrados.

Existe um “eis-me aqui” silencioso na atitude de José. 

Temos poucas palavras dele registradas, mas suas ações falam alto, muito alto.

José tornou-se protagonista desta história. Adotou o menino. Encarou a tarefa. Não se ausentou. Não se escondeu. Posso ouvir José orando: “Se este que foi gerado é teu, Senhor, farei de tudo para estar à altura desta responsabilidade. Empenhar-me-ei para que a tua glória seja vista em sua vida. Conta comigo, Senhor”.

José fez do seu filho sua missão.

É preciso que se diga também que “justo” não significa, como pode erroneamente parecer, insensível ou turrão.

Na vida de Deus, assim como na vida de gente de Deus, a justiça não ofusca ou impede o amor e a misericórdia. Em José tampouco. A Bíblia afirma que Deus é fiel e justo, e que perdoa nossos pecados (1Jo 1.9).

Nós, pais brasileiros, que temos dificuldade de conciliar justiça e graça, disciplina e perdão, limites e liberdade, correção e comunhão, precisamos aprender de Deus. Precisamos aprender de José.

Como José, verdadeiros pais adotam.

Acolhem, cuidam e entregam. Sabem que os filhos não são seus. Na linguagem do Salmista, filhos “são herança do Senhor”, isto é, “herança que pertence ao Senhor”! São presentes que desfrutamos com prazo pré-estabelecido. Dádivas que, de tão sagradas, não podemos tomar posse. Dons em forma de gente, que um dia crescem… e se vão!

Nosso papel como pais adotivos é, neste curto espaço de tempo que os temos sob o nosso teto, ensinar-lhes a caminhar com o Pai de amor.

Deus é Pai, o verdadeiro Pai.

Com José, nós pais, aprendemos que nossa vocação suprema é devolvermos nossos filhos a Deus.

Somos mordomos. Aios.

Pais adotivos.

Como José.

Como Deus.