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“Mídias do futuro / Futuro das mídias”

Matthias Horx é considerado o mais destacado pesquisador de tendências e do futuro nos países de língua alemã. Seu Instituto do Futuro, com sede em Frankfurt do Meno, é um think tank da pesquisa do futuro.

Entrevista: Martin Orth, na Deutschland Online

1. A sociedade da informação está cada vez mais intrincada. A todo momento, novas tecnologias abrem espaço para novas fontes de informação. Como o senhor pessoalmente usa as mídias?

Como alguém que foi criança e jovem no século passado, sou naturalmente um analogista. Eu amo livros, revistas, palavras impressas. Meus filhos também gostam, embora tenham crescido com o computador. Fora isso, sou um multitoxicólogo de mídias. Eu navego em todas as plata­formas midiáticas, sejam elas quadradas na forma de um monitor ou lisas e palpáveis como um livro sólido. E isto 24 horas por dia. Eu também brinco com meus filhos, de jogos online no computador e, assim, tenho outra visão da realidade digital. Ela pode de fato proporcionar muito prazer, menos aos velhos paranóicos que, em cada esquina, preveem o fim do mundo.

2. As novas mídias tornaram muitas coisas mais simples e rápidas, mas vieram acompanhadas de fenômenos como o isola­mento social. É preciso aprender a conviver com as mídias?

Considero a ideia do “isolamento através das mídias” uma besteira. Solitários foram os homens que, no passado, viviam em vales distantes, no interior, quando ainda não havia sequer telefone. Hoje, tais pessoas talvez sejam solitárias porque são neuróticas ou depressivas. No final das contas, as mídias conectam todos à grande corrente, trate-se de informação detalhada ou lixo profano. É natural que as pessoas precisem de um certo tempo para conhecer um novo meio, mas elas também possuem habilidade para tal. Pense quanto tempo a alfabetização durou. Se compararmos, as pessoas adap­tam-se aos meios eletrônicos incrivelmente rápido. Entretanto, não é qualquer um que consegue aproveitar as possibilidades sociais e de conhecimento pela internet. Ainda há muitos consumidores passivos. Para eles, a internet é, na melhor das hipóteses, um bom meio de consulta. No fundo, é uma questão de formação. Quem estudou, é curioso e ambiciona a ascensão social, usa as novas mídias com maior intensidade.

3. Jovens não se motivam a ler jornais, enquanto as pessoas mais velhas têm dificuldade com redes sociais na internet. As mídias estão dividindo nossa sociedade? As mídias estão promovendo a individuali­zação da sociedade?

Este último ponto até que seria bom, pois, para mim, individualização é um termo positivo. Nós todos desejamos nos tornar indivíduos diferentes uns dos outros, cada um com sua personalidade, não é? E mídias de todos os tipos servem, no fim das contas, a este propósito. Também as telenovelas têm, como muitos estudos já mostraram, aspectos educativos e emancipativos. Quem acompanhou durante toda a vida a novela de tevê Lindenstrasse, aprendeu a diferenciação social, a tolerância e o humanitarismo. E os mais velhos estão recuperando rapidamente o tempo ao aprender a usar a internet.

4. A mudança no cenário da comunicação atinge igualmente rituais sociais como a leitura matinal do jornal ou o assistir coletivo ao futebol?

Sim e não. Assistir futebol em grupo é um acontecimento de grupo, que está profundamente ancorado em nossos genes. As pessoas, sobretudo os homens, vão provavelmente fazer isto até que o Sol esfrie. É um ritual. A leitura matinal de jornal também já foi um ritual, com o qual sobretudo homens podiam justificar sua falta de comunicação no café da manhã. Ou seja, jornais têm ainda outras finalidades além de informar. São escudos protetores do mau humor matinal e proteção à privacidade em ambientes públicos, como cafeterias e aeroportos. Estou certo de que as pessoas vão encontrar um substituto, caso algum dia o jornal impresso desapareça. Talvez grandes monitores flexíveis de computador, que se possa usar como para-vento ou véu.

5. Fala-se que as novas mídias eliminam as tradicionais. Como será a mescla dos meios de comunicação daqui a 20 anos?

Somente em casos raros as novas mídias eliminam as antigas por completo. Em geral, há uma nova mescla ou um com­plemento. Quando surgiu a televisão, diziam que o cinema morreria, e a internet já deveria ter assassinado ambos há muito tempo. Absurdo. Em 20 anos, a internet terá se tornado uma “omninet”. Estará em todos os lugares e em nenhum deles. Será a plataforma na qual vão estar todos os conteúdos. Mas os aparelhos de re­produção ainda serão diferenciados. Ainda haverá livros e revistas, talvez até mesmo mais bonitos, preciosos e com cheiro melhor. E monitores dobráveis, como papéis. A questão decisiva será o quanto nossas habilidades cognitivas terão se desenvolvido.

6. O senhor prevê um “digital backlash”, ou seja, um golpe, um retrocesso na euforia da internet. Por que razões? Ele já começou? E quais serão suas consequências?

Ele acontece diariamente, toda vez que alguém não encontra na internet uma utilidade que os visionários dos anos 1990 prometeram. Existe uma tendência sutil do off-line. Um número expressivo de pessoas considera a maré de imagens e áudios enervante e perturbadora e tem priorizado novamente as experiências físicas, palatáveis, pessoais, em tempo real. A internet não cumpre, muitas vezes, o que promete. E ainda temos uma grande parte da população que não tem condi­ções de usar a internet como meio de rede, porque não tem formação suficiente para isso ou não domina as técnicas sociais. Somente aproveitamos o potencial da rede como meio de conhecimento quando nós também pensamos, perguntamos, comunicamos e trabalhamos em rede.

7. Isto significa um retorno às mídias clássicas?

A internet já transformou os jornais, ao torná-los mais curtos, concisos e, muitas vezes, melhores. Ela está funcionando como um fator de seleção. As mídias inexpressivas, excessivas, serão extintas; as demais se transformarão.

8. Vejamos a mídia impressa. Quais são seus pontos fortes? Qual seu futuro?

Acho que esta categoria não terá sentido no futuro. Não haverá mais uma “mídia impressa”, porém determinadas marcas de mídia, que irão sempre se diferenciar quanto a conteúdo, qualidade, acesso mundial, ideologias. Uma revista como a americana Wired já é hoje um produto midiático em muitos canais e assim são também os jornais, forma crescente. A revista Der Spiegel será, no futuro, domicílio de uma determinada visão de mundo, seja em papel, no celular ou no monitor. Um veículo que permanecer apenas impresso será uma mídia bastante isolada.

9. Como o senhor vê os modelos de negócios para os fornecedores de conteúdo?

Muito diverso. Alguns ainda irão ganhar dinheiro no setor de qualidade. Outros cumprirão sobretudo funções sociais e viverão com modelos de clube e gratui­dade, ou seja, modelos de negócios nos quais determinados serviços básicos serão oferecidos gratuitamente e somente ofertas extras representarão faturamento. E ainda haverá outros que irão despedir-se de conteúdos puros e venderão serviços e acessos. Jornais regionais, por exemplo, poderão evoluir para provedores de ser­viços completos que, além de jornal, também fornecerão eletricidade, água e crédito.

10. Contra as expectativas, o rádio tem se saído extraordinariamente bem neste cenário de mudança na área de comunicação. A que o senhor atribui este fenômeno?

Rádio é simples e descomplicado, uma legítima tendência retrô contra a veloz mudança no mundo dos meios de comunicação, no qual não se entende mais nada. No rádio, uma pessoa fala para a outra. É algo simplesmente bonito.

11. Na comparação internacional, o senhor percebe algum fenômeno alemão no uso das mídias?

Não, os alemães são apenas mais tensos e, a cada novidade, desconfiam primeiro que o fim do mundo se aproxima, antes de então se tornarem fãs absolutamente fiéis.

12. Em filmes de ficção científica, fenômenos atuais são, com frequência, simplesmente projetados para o futuro. Como se faz isto na pesquisa do futuro? Como os senhores chegam às conclusões?

Através de pesquisas obstinadas e correções permanentes na formação do modelo. Nós, naturalmente, também projetamos o futuro. Só temos que fazê-lo de forma mais inteligente e mais diferenciada que nossos antecessores.

13. A futura paisagem midiática ainda mudará outras ferramentas, as quais nós hoje mal podemos vislumbrar?

Um exemplo: entrevistas por e-mail como esta serão diálogos no futuro. Eu poderia também lhe perguntar, o que o senhor pretende com sua pergunta ou por que quer saber algo…

09.11.09