Arquivo da categoria: Arte

I belong ~ Kathryn Scott

I Belong ~ by Mildred Rainey & Kathryn Scott

Not angels, nor demons, no power on earth or heaven
Not distance, nor danger, no trouble now or ever

Nothing can take me from your great love
Forever this truth remains

I belong, I belong to you

Not hardship, nor hunger, no pain or depth of sorrow
Not weakness, nor failure, no broken dream or promise

Jesus de Hollywood

“Jesus de Nazaré”, de Zeffirelli, em 1977: uma das várias interpretações do cinema sobre Cristo

Estudos mostram como o personagem mais importante da era cristã deixou de ser apenas um ícone sagrado e ganhou várias facetas ao migrar para o cinema.

[Texto de Rodrigo Cardoso, Isto é, 3 dez 2010]

Jesus Cristo passou quase dois mil anos como monopólio de padres e pastores. A essas pessoas cabia a reprodução de episódios de sua trajetória aqui na Terra. Até que um dia o cinema ligou seus projetores e o homem mais importante da cultura ocidental deixou de ser exclusividade dos religiosos. Foi então que a figura do diretor de cinema o despregou do posto de ícone intocado, sagrado, e o colocou na vitrine como um personagem de carne e osso, sujeito a todos os problemas humanos. Cada vez mais afastado de seu significado transcendental, passou a ser retratado como palhaço, adolescente irritadiço, sofreu com dramas existenciais e se contrapôs a Deus (leia quadro ao lado.), só para citar alguns roteiros. Não foi tranquila essa mudança, pelo contrário. Os cineastas conquistaram a duras penas a liberdade para retratar Jesus sem amarras.

O impacto da disputa entre o Jesus catequizado pela Igreja e o comercializado pelos estúdios vem sendo analisado pelo historiador André Chevitarese, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), que confecciona um livro sobre o tema a ser lançado em 2011. “Aquela imagem chapada de Cristo, relatada por padres ou descrita pelos Evangelhos, ganhou movimento com o cinema. Foi assim que aprendemos com quem ele conversava, o tom de sua voz, a cor de sua barba, o que comia e onde morava”, diz Chevitarese. Com Jesus nas mãos de roteiristas, homens e mulheres, com crenças diversas e até ateus, não tardou para que grupos religiosos tentassem frear a exploração de sua imagem. Continue lendo

Sensibilidade, arte e cultura na contemporaneidade

[Valério Cruz Brittos e Jonathan Reis, Observatório de Imprensa, 30 nov 2010]

Atualmente, grande parcela da sociedade não tem condições plenas para analisar obras de arte profundamente, reconhecendo seus referentes e possibilidades de interpretação. Prevalecem olhares sem a sensibilidade e o senso crítico necessários para avaliar um trabalho artístico em seu todo. Isto é comprovado ante a popularização de músicas com diversos tipos de apelo fácil, impulsionadas midiaticamente, embora cada sujeito tenha o direito de absorver artisticamente o que desejar (ou puder). Contudo, muito se perde neste processo.

Já ensinou o sociólogo francês Pierre Bourdieu, no livro A distinção: crítica social do julgamento (São Paulo: Edusp, 2007), que a competência artística significa apreciar obras de arte legítimas de maneira legítima. É produto de educação e origem social, numa sociedade de classes. A classe social tem relação com o consumo cultural, pois o gosto, construído a partir de um processo educativo, serve como forma de distinção. O indivíduo que não viveu tal experiência e deleite no plano familiar pode buscar o saber erudito com o estudo da arte, necessária nesta relação cultural. Nesta dinâmica, a mídia poderia contribuir, difundindo conhecimentos e experiência profundas, o que não acontece. Continue lendo

Tu sempre estás comigo ~ Thomas Merton

Senhor meu Deus,
não tenho idéia de aonde estou indo.
Não vejo o caminho diante de mim.
Não posso saber com certeza onde terminará.
Na verdade, nem sequer, em verdade, me conheço.
E o fato de eu pensar que estou seguindo tua vontade,
não significa que o esteja.
Mas acredito
que o desejo de te agradar te agrada, de fato.
E espero ter esse desejo em tudo que estiver fazendo.
Espero jamais vir a fazer alguma coisa
distante desse desejo.
E sei que, se agir assim,
tu hás de me levar pelo caminho certo,
embora eu possa nada saber sobre o mesmo.
Portanto, hei de confiar sempre em ti,
ainda que eu possa parecer estar perdido
e sob a sombra da morte.
Não hei de temer,
pois tu sempre estás comigo,
e nunca hás de deixar
que eu enfrente meus perigos sozinho.

O cinema cristológico e as reescritas audiovisuais

[Publicado no IHU, 28 nov 2010]

Nos últimos anos, manifestou-se “um particular interesse pelo sagrado (os seus símbolos e as suas retóricas de narrações) nos dispositivos textuais do gênero, detendo-se com atenção específica na relação entre os textos bíblicos e as reescritas audiovisuais, ocupando-se também da relação entre o cinema e a história de Jesus“. É preciso “identificar uma abordagem específica que possa oferecer categorias de orientação interpretativa”.

A análise é do doutor em história do cinema Dario E. Viganò, professor de comunicação da Pontifícia Universidade Lateranense, onde preside o Instituto Redemptor Hominis. Nascido no Rio de Janeiro, é sacerdote ordenado pelo cardeal Carlo Maria Martini.

O artigo, intitulado originalmente “Il cinema cristologico e riscritture audiovisive: Il problema delle traduzioni intersemiotiche”, faz parte do livro “Il volto e gli sguardi” (Ed. EDB, 2010), organizado por Sandra Isetta, e foi publicado na revista Il Regno, nº 18, novembro de 2010. A tradução é de Moisés Sbardelotto. Continue lendo

Poemas: Manoel Bandeira e Cecília Meireles

Renúncia (Manuel Bandeira)

Chora de manso e no íntimo… Procura
Curtir sem queixa o mal que te crucia:
O mundo é sem piedade e até riria
Da tua inconsolável amargura.
Só a dor enobrece e é grande e é pura.
Aprende a amá-la que a amarás um dia.
Então ela será tua alegria,
E será, ela só, tua ventura…
A vida é vã como a sombra que passa…
Sofre sereno e de alma sobranceira,
Sem um grito sequer, tua desgraça.
Encerra em ti tua tristeza inteira.
E pede humildemente a Deus que a faça
Tua doce e constante companheira…

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Derechos Humanos = Menos Pobreza

La crisis económica global está empujando a millones de personas a la pobreza y exponiéndolas de manera creciente a sufrir violaciones de derechos humanos como la inseguridad alimentaria y el desalojo forzoso. Para poder frenar esta trágica agudización del sufrimiento humano, el mundo necesita con urgencia una respuesta diferente y un nuevo estilo de liderazgo.

El mundo padece una crisis de derechos humanos. Miles de millones de personas sufren la ausencia de seguridad, justicia y dignidad en todas las regiones del planeta. Sólo se podrá encontrar una solución mediante una respuesta coordinada y concertada que se cimiente en los derechos humanos y el Estado de derecho. Esto exigirá un liderazgo enérgico.

La Campaña Exige Dignidad de Amnistía Internacional aspira a conseguir que se ponga fin a la pobreza global trabajando para reforzar el reconocimiento y la protección de los derechos humanos de las personas que viven en la pobreza. La campaña exigirá liderazgo, rendición de cuentas y transparencia, factores esenciales para acabar con las violaciones de derechos humanos que mantienen a la gente sumida en la pobreza. Continue lendo

Se eu desistir ~ Charles Greenaway

Bench on Landscape

Se eu desistir
O que ganharei?
Terminará a batalha? Ficarei livre?
Não, nem a porta se fechava, nem a batalha terminava,
Porque Deus teria outro para ficar na brecha
Se eu desistisse.

Se eu desistir,
O que farei?
Procurarei abrigo do calor? Esquecerei o clamor do perdido?
Por um tempo seria feliz, depois descobriria que já não o era
E gastaria o meu tempo orando para fazer algo
E dizendo a Deus, “porque desisti?”

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Druidas comemoram ‘Halloween original’

httpv://www.youtube.com/watch?v=uZlWsXFvQ8I

Enquanto milhares de pessoas em vários países usam abóboras e esqueletos para comemorar o Halloween, druidas da Floresta Charmwood, inspirados por religiões ancestrais, celebram a festa pagã de Samhain.

Vestidos a caráter, eles bebem hidromel, dizem se comunicar com espíritos e celebram os mortos, além do fim de mais um ano.

Para druidas, são também um instinto pagão do mundo natural e a chegada da escuridão que inspiram as festas de Halloween no hemisfério norte.

“A maioria pode não saber, mas eles estão se conectando com algo natural no Halloween, que lhes traz satisfação e ajuda na transição ao período mais escuro do ano”, afirmou Michelle Axe à BBC.

A cerimônia druídica é conduzida por três bruxas, que jogam pedrinhas no caldeirão para se livrar de tristezas. Continue lendo

O crime de Lady Gaga ~ por Marcia Tiburi

Marcia Tiburi analisa o pós-feminismo pop de Lady Gaga

Lady Gaga é o mais recente ídolo pop da cena internacional. Entenda-se por ídolo pop um indivíduo que encanta as massas com a habilidade artística de que é capaz sendo seu autor ou o mero representante de uma estética inventada por publicitários e estrategistas de produtos culturais. Nesse sentido, todo ídolo pop age como o flautista de Hamelin conduzindo por certo efeito de hipnose uma quantidade sempre impressionante de pessoas. Ele é também um guia estético e moral das massas. A propósito, entenda-se por massa um grupo de indivíduos que, ao se encontrar com outros, perde justamente a individualidade, tornando-se sujeito de sua própria dessubjetivação. Em outras palavras, ele é hipnotizado como se estranhamente desejasse sê-lo. A Indústria Cultural depende desse mecanismo, por meio do qual oferece ao indivíduo a oportunidade de se perder com a sensação de que está ganhando. O ídolo pop é a humana mercadoria que permite o gozo pelo logro que o espectador logrado aplica a si mesmo.

Lady Gaga certamente veio para nos lograr. Mas, como disse Walter Benjamin sobre livros (e também putas), muitas vezes a mercadoria vale muito mais do que o dinheirinho que pagamos por ela.

O paradoxal desejo das massas

Antes de mais nada, é preciso ver que Lady Gaga, a despeito da qualidade boa ou má de si mesma e do que ela produz, vem a nós com números impressionantes. Se na internet seus vídeos são vistos por milhões de pessoas (certamente, quando você ler este artigo, os números serão ainda maiores) é porque ela mesma sabe – ou o diretor e roteirista de seus belos videoclipes nos quais a quantidade aparece, seja na nota de dólar com o rosto de Gaga como no vídeo de “Paparazzi”, seja em “Bad Romance” nos índices na cena dos computadores – que se trata em sua obra da questão da quantidade, mais do que da qualidade. A Indústria Cultural sempre tem na quantidade uma questão mais importante do que a qualidade, mas, se Lady Gaga sabe disso e não o esconde, é porque elevou o cinismo a discurso, mas, ao mesmo tempo, lança-nos uma ironia capaz de fazer pensar.

A questão da quantidade adquire um contorno subjetivo na mentalidade dos indivíduos aniquilados no todo. Assim, uma característica expositiva da condição das massas de nosso tempo é o próprio “desejo de ser massa”. Trata-se da ânsia de adesão ao todo que se disfarça no desejo de saber o que todo mundo sabe, ver o que todo mundo vê. Complicado falar de desejo das massas, quando a “massa” remonta à possibilidade de se deixar moldar pela ação exterior justamente por ausência de desejo. Podemos, no entanto, entendê-lo usando uma imagem gasta como a da ovelha a participar do rebanho. Um modo de ter lugar desaparecendo mimeticamente no todo. Nesse sentido, o desejo de ser massa é o mesmo que nos coloca na situação de fazer parte da audiência fazendo com que liguemos a televisão no programa mais visto, que queiramos ver o filme com a maior bilheteria, que, caso cheguemos a desejar um livro, seja da lista dos mais vendidos. Fazer parte da audiência é a garantia de que em algum momento estaremos juntos, que faremos parte de uma comunidade mesmo que ela seja apenas “espectro”. A angústia da solidão, da separação e da própria individuação desaparece por um passe de mágica da imagem do ídolo pop.

Uma estética pop para o pós-feminismo?

A obra da jovem Lady Gaga não é objeto descartável como a maioria das mercadorias promovidas no contexto da indústria e do mercado cultural. Se nos detivermos em sua música, em sua dança ou em sua imagem isoladamente, não entenderemos o todo da mercadoria. Portanto, é preciso estar atento à performance que ela realiza. A apreciação disto que devemos hoje chamar de obra-produto ou produto-obra deve começar por aí, tendo em vista que, acima de tudo, Lady Gaga é uma performer que agrega em seus vídeos diversas formas artísticas que vão da música ao cinema, passando pela dança e chegando a uma relação curiosa com um aspecto inusitado da produção contemporânea nas artes visuais. Lady Gaga tange em seus vídeos mais famosos questões que estão presentes na obra de artistas contemporâneas que podemos chamar de vanguardistas por falta de expressão melhor, tais como Cindy Sherman, Daniela Edburg e Chantal Michel. No Brasil, Karine Alexandrino, Paola Rettore ou o pernambucano Bruno Vilella praticam a mesma suave ironia até o mais cáustico deboche com trabalhos sobre mulheres mortas.

O tema da mulher morta torna-se quase um lugar-comum na arte contemporânea, como foi no século 19. Naquele tempo, ele representava o impulso próprio do romantismo que via na mulher falecida e inválida um ideal agora retomado de modo irônico por diversas artistas contemporâneas. Lady Gaga vai, no entanto, muito além dessas artistas em termos de coragem feminista. Enquanto elas zombam das mulheres estereotipadas que morrem como Ofélias por um homem, Lady Gaga, de modo mais surpreendente e corajoso do que importantes artistas cultas, dá um passo adiante.

No vídeo de “Paparazzi” fica exposto o amor-ódio que um homem nutre por uma mulher, a invalidez à qual ela é temporariamente condenada por sua violência e, por fim, uma vingança inesperada com o assassinato desse mesmo homem. “Incitação à violência”, pensarão as mentes mais simples; “feminismo como ódio aos homens”, dirá a irreflexão sexista acomodada, quando na verdade se trata de uma irônica inversão no cerne mesmo do jogo simbólico que separa mulheres e homens. Se em “Paparazzi” o deboche beira o perverso autorizado psicanaliticamente (a mulher sai da posição deprimida ou melancólica e aprende a gozar com seu algoz, que ela transforma em vítima), em “Bad Romance”, “o vídeo mais visto de todos os tempos”, mulheres de branco – como noivas dançantes – surgem de dentro de esquifes futuristas para curar uma louca que chora querendo ter um “mau romance” com um homem. Um contraponto é criado no vídeo entre a imagem do rosto da própria Gaga levissimamente maquiado, demarcando o caráter angelical de sua personagem, em contraposição ao caráter doentio da personagem da mesma Gaga de cabelos arrepiados e olhos esbugalhados. Entre eles a bailarina sensual junto de suas companheiras faz o elogio do corpo que é obrigado a se erotizar diante de um grupo de homens.

A noiva é queimada. Sobre a cama, no fim, a noiva como um robô um pouco avariado, mas ainda viva, contempla o noivo cadáver. A ironia é o elogio do amor-paixão, do amor-doença e morte ao qual foi reduzido o amor romântico pela estética pop da ninfa pós-feminista. O feminismo só tem a agradecer.

Em “Telephone”, a estética eleita é a da lésbica e da pin-up. Ambas criminosas. A primeira por ser uma forma de vida feminina que dispensa os homens, a segunda por ameaçá-los com uma estética da captura (a mulher-imagem-de-papel, a mulher “cromo”, a mulher-desenho-animado que configura o conceito do “broto”, do “pitéu”). No mesmo vídeo o personagem de Gaga compartilha com Beyoncé uma cumplicidade incomum entre mulheres.

Esse sinal é dado no meio do vídeo, quando Beyoncé vai resgatar Gaga na prisão e ambas mordem um pedaço de pão, que logo é lançado fora como algo desprezível. A comida mostra-se aí como o objeto do crime. O vídeo é mais que um elogio ao assassinato do mau romance, ou da vingança contra o evidente amor bandido de quem a personagem de Beyoncé quer se vingar. Trata-se de uma profanação da comida pelo veneno que nela é depositado. O amor bandido é morto pela comida, uma arma simbólica muito poderosa associada à imagem da mulher-mãe, da mulher-doação, dedicada a alimentar seu homem na antipolítica ordem doméstica.

O palco é a lanchonete de beira de estrada como em Assassinos por Natureza, de Oliver Stone. O assassinato é o objetivo do serviço das duas moças perversas que, no fim do vídeo, dançam vestidas com as cores da bandeira norte-americana – meio Mulher Maravilha – diante dos cadáveres de suas vítimas, já que, além do amor bandido, todos morreram. Cinismo? Sem dúvida, mas como paradoxal autodenúncia.

Mas o maior crime de Gaga, aquilo que fará com que tantos a odeiem, não será, no entanto, o feminismo sem-vergonha que ela pratica como uma brincadeira em que o crime é justamente o que compensa? E, como ídolo pop, não poderá soar aos mais conservadores como um modo de rebelar as massas de mulheres subjugadas pela perversa autorização ao gozo, doa a quem doer?

Texto de Marcia Tiburi ~ Revista Cult, 8 mai 2010