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O novo transcendente ~ por Frei Betto

A história da humanidade é uma história de sujeições. No período pré-moderno, sujeição aos deuses do politeísmo, ao Deus do monoteísmo, ao Rei da monarquia e ao Povo (sujeito abstrato) da República. Havia sempre uma figura do Outro ao qual todos deveriam se reportar.

Esse Grande Outro prescrevia o certo e o errado, o bem e o mal, a graça e o pecado, a lei e o crime. O mundo se configurava de acordo com os preceitos do Grande Outro. As alternativas eram simples: sujeitar-se sob promessa de recompensa ou rebelar-se sob risco de punição.

Na modernidade, o Outro se multiplicou, adquiriu várias faces, descentralizou-se na diversidade de ideologias, sistemas de governo e crenças religiosas. Tanto a antiguidade quanto a modernidade nos remetiam à transcendência, ainda que fundada na razão. Se não era Deus, era o Partido, o líder supremo, as ideias inquestionáveis. Algo ou alguém nos precedia e determinava o nosso comportamento, incutindo-nos gratificação ou culpa.

A pós-modernidade, em cuja porta de entrada nos encontramos, promete fazer de nós sujeitos livres de toda sujeição. Seria a volta ao protagonismo exacerbado, em que cada indivíduo é a medida de todas as coisas. Já não se vive em tempos de cosmogonias e cosmologias, teogonias e ideologias. Agora todos os tempos convergem simultaneamente ao espaço reduzido do aqui e agora. Graças às novas tecnologias de comunicação, tempo e espaço ganham dimensão holográfica: cabem em cada pequeno detalhe do aqui e agora.

Será que, de fato, a pós-modernidade nos emancipa do transcendente e da transcendência? Introduz-nos no “desencantamento do mundo” apontado por Max Weber?

A resposta é não.

Há um novo Grande Outro que nos é imposto como paradigma inquestionável: o Mercado. As sedutoras imagens deste deus implacável são disseminadas por seu principal oráculo: a publicidade. À semelhança de seu homólogo de Delfos, nos adverte: “Dize o que consomes e eu te direi quem és”.

O grande teólogo desse novo deus foi Adam Smith. Inspirado na física de Newton, em ?A riqueza das nações? e ?A teoria dos sentimentos morais?, Smith aplicou à economia a metáfora religiosa do Grande Relojoeiro que preside o Universo.

O relógio funciona graças à precisão mecânica fabricada por alguém fora dele e invisível a quem o porta: o relojoeiro. Assim, na opinião de Newton, seria o Universo. Na de Smith, a vida social regida por interesses econômicos. A diferença é que o Deus Relojoeiro de Newton é chamado de Mão Invisível por Smith. Segundo este, o egoísmo de cada um, guiado pela Mão Invisível, promoveria o bem de todos…

É exatamente o que afirma Milton Friedman, líder da Escola de Chicago: ?Os preços que emergem das transações voluntárias entre compradores e vendedores são capazes de coordenar a atividade de milhões de pessoas, sendo que cada uma conhece apenas o próprio interesse.?

Esse o fundamento do pensamento liberal e do sistema capitalista. É o principio do /laisser faire/, deixar (deus) fazer. O que, traduzido em termos políticos, significa desregulamentar, não apenas as esferas econômicas e políticas, mas também a moral. Abaixo a ética de princípios e viva a ética de resultados! Nesse protagonismo pós-moderno, cada ego é a medida de todas as coisas. O que imprime ao sujeito (no sentido latino de sujeição, submissão) a impressão de autonomia e liberdade.

O resultado do novo paradigma centrado no deus Mercado todos conhecemos: degradação ambiental; guerras; gastos exorbitantes em armas, sistemas de defesa e segurança; narcotráfico e dependência química; esgarçamento dos vínculos familiares; depressão, frustração e infelicidade.

Ainda é tempo de professarmos o mais radical ateísmo frente ao deus Mercado e, iconoclastas, apelarmos à ética para introduzir, como paradigma, a generosidade, a partilha dos bens da Terra e dos frutos do trabalho, a felicidade centrada nas condições dignas de vida e no aprofundamento espiritual da subjetividade.

Isso, contudo, só será possível se não ficarmos restritos à esfera da autoajuda, das terapias tranquilizadoras da alma para suportarmos o estresse da competitividade, e nos mobilizarmos comunitariamente para organizar a esperança em novo projeto político fundado na globalização da solidariedade.

Eis o desafio ético que, como assinalou José Martí, será capaz de articular emancipação política e emancipação espiritual.

Fonte: Portal Brasil de Fato, 23 jul 2010

The Moral Naturalists ~ by David Brooks

Where does our sense of right and wrong come from? Most people think it is a gift from God, who revealed His laws and elevates us with His love. A smaller number think that we figure the rules out for ourselves, using our capacity to reason and choosing a philosophical system to live by.

Moral naturalists, on the other hand, believe that we have moral sentiments that have emerged from a long history of relationships. To learn about morality, you don’t rely upon revelation or metaphysics; you observe people as they live.

This week a group of moral naturalists gathered in Connecticut at a conference organized by the Edge Foundation. One of the participants, Marc Hauser of Harvard, began his career studying primates, and for moral naturalists the story of our morality begins back in the evolutionary past. It begins with the way insects, rats and monkeys learned to cooperate.

By the time humans came around, evolution had forged a pretty firm foundation for a moral sense. Jonathan Haidt of the University of Virginia argues that this moral sense is like our sense of taste. We have natural receptors that help us pick up sweetness and saltiness. In the same way, we have natural receptors that help us recognize fairness and cruelty. Just as a few universal tastes can grow into many different cuisines, a few moral senses can grow into many different moral cultures.

Paul Bloom of Yale noted that this moral sense can be observed early in life. Bloom and his colleagues conducted an experiment in which they showed babies a scene featuring one figure struggling to climb a hill, another figure trying to help it, and a third trying to hinder it.

At as early as six months, the babies showed a preference for the helper over the hinderer. In some plays, there is a second act. The hindering figure is either punished or rewarded. In this case, 8-month-olds preferred a character who was punishing the hinderer over ones being nice to it.

This illustrates, Bloom says, that people have a rudimentary sense of justice from a very early age. This doesn’t make people naturally good. If you give a 3-year-old two pieces of candy and ask him if he wants to share one of them, he will almost certainly say no. It’s not until age 7 or 8 that even half the children are willing to share. But it does mean that social norms fall upon prepared ground. We come equipped to learn fairness and other virtues.

These moral faculties structure the way we perceive and respond to the world. If you ask for donations with the photo and name of one sick child, you are likely to get twice as much money than if you had asked for donations with a photo and the names of eight children. Our minds respond more powerfully to the plight of an individual than the plight of a group.

These moral faculties rely upon emotional, intuitive processes, for good and ill. If you are in a bad mood you will make harsher moral judgments than if you’re in a good mood or have just seen a comedy. As Elizabeth Phelps of New York University points out, feelings of disgust will evoke a desire to expel things, even those things unrelated to your original mood. General fear makes people risk-averse. Anger makes them risk-seeking.

People who behave morally don’t generally do it because they have greater knowledge; they do it because they have a greater sensitivity to other people’s points of view. Hauser reported on research showing that bullies are surprisingly sophisticated at reading other people’s intentions, but they’re not good at anticipating and feeling other people’s pain.

The moral naturalists differ over what role reason plays in moral judgments. Some, like Haidt, believe that we make moral judgments intuitively and then construct justifications after the fact. Others, like Joshua Greene of Harvard, liken moral thinking to a camera. Most of the time we rely on the automatic point-and-shoot process, but occasionally we use deliberation to override the quick and easy method. We certainly tell stories and have conversations to spread and refine moral beliefs.

For people wary of abstract theorizing, it’s nice to see people investigating morality in ways that are concrete and empirical. But their approach does have certain implicit tendencies.

They emphasize group cohesion over individual dissent. They emphasize the cooperative virtues, like empathy, over the competitive virtues, like the thirst for recognition and superiority. At this conference, they barely mentioned the yearning for transcendence and the sacred, which plays such a major role in every human society.

Their implied description of the moral life is gentle, fair and grounded. But it is all lower case. So far, at least, it might not satisfy those who want their morality to be awesome, formidable, transcendent or great.

Source: NY Times -  july 22, 2010

A World Split Apart ~ by Alexander Solzhenitsyn

Text of Address by Alexander Solzhenitsyn at Harvard Class Day Afternoon Exercises, Thursday, June 8, 1978

I am sincerely happy to be here with you on this occasion and to become personally acquainted with this old and most prestigious University. My congratulations and very best wishes to all of today’s graduates.

Harvard’s motto is “Veritas.” Many of you have already found out and others will find out in the course of their lives that truth eludes us if we do not concentrate with total attention on its pursuit. And even while it eludes us, the illusion still lingers of knowing it and leads to many misunderstandings. Also, truth is seldom pleasant; it is almost invariably bitter. There is some bitterness in my speech today, too. But I want to stress that it comes not from an adversary but from a friend.

Three years ago in the United States I said certain things which at that time appeared unacceptable. Today, however, many people agree with what I then said…

A World Split Apart

by Alexander Solzhenitsyn

The split in today’s world is perceptible even to a hasty glance. Any of our contemporaries readily identifies two world powers, each of them already capable of entirely destroying the other. However, understanding of the split often is limited to this political conception, to the illusion that danger may be abolished through successful diplomatic negotiations or by achieving a balance of armed forces. The truth is that the split is a much profounder and a more alienating one, that the rifts are more than one can see at first glance. This deep manifold split bears the danger of manifold disaster for all of us, in accordance with the ancient truth that a Kingdom — in this case, our Earth — divided against itself cannot stand.

Contemporary Worlds

There is the concept of the Third World: thus, we already have three worlds. Undoubtedly, however, the number is even greater; we are just too far away to see. Any ancient deeply rooted autonomous culture, especially if it is spread on a wide part of the earth’s surface, constitutes an autonomous world, full of riddles and surprises to Western thinking. As a minimum, we must include in this category China, India, the Muslim world and Africa, if indeed we accept the approximation of viewing the latter two as compact units. For one thousand years Russia has belonged to such a category, although Western thinking systematically committed the mistake of denying its autonomous character and therefore never understood it, just as today the West does not understand Russia in communist captivity. It may be that in the past years Japan has increasingly become a distant part of the West, I am no judge here; but as to Israel, for instance, it seems to me that it stands apart from the Western world in that its state system is fundamentally linked to religion.

How short a time ago, relatively, the small new European world was easily seizing colonies everywhere, not only without anticipating any real resistance, but also usually despising any possible values in the conquered peoples’ approach to life. On the face of it, it was an overwhelming success, there were no geographic frontiers to it. Western society expanded in a triumph of human independence and power. And all of a sudden in the twentieth century came the discovery of its fragility and friability. We now see that the conquests proved to be short lived and precarious, and this in turn points to defects in the Western view of the world which led to these conquests. Relations with the former colonial world now have turned into their opposite and the Western world often goes to extremes of obsequiousness, but it is difficult yet to estimate the total size of the bill which former colonial countries will present to the West, and it is difficult to predict whether the surrender not only of its last colonies, but of everything it owns will be sufficient for the West to foot the bill.

Convergence

But the blindness of superiority continues in spite of all and upholds the belief that vast regions everywhere on our planet should develop and mature to the level of present day Western systems which in theory are the best and in practice the most attractive. There is this belief that all those other worlds are only being temporarily prevented by wicked governments or by heavy crises or by their own barbarity or incomprehension from taking the way of Western pluralistic democracy and from adopting the Western way of life. Countries are judged on the merit of their progress in this direction. However, it is a conception which developed out of Western incomprehension of the essence of other worlds, out of the mistake of measuring them all with a Western yardstick. The real picture of our planet’s development is quite different.

Anguish about our divided world gave birth to the theory of convergence between leading Western countries and the Soviet Union. It is a soothing theory which overlooks the fact that these worlds are not at all developing into similarity; neither one can be transformed into the other without the use of violence. Besides, convergence inevitably means acceptance of the other side’s defects, too, and this is hardly desirable.

If I were today addressing an audience in my country, examining the overall pattern of the world’s rifts I would have concentrated on the East’s calamities. But since my forced exile in the West has now lasted four years and since my audience is a Western one, I think it may be of greater interest to concentrate on certain aspects of the West in our days, such as I see them.

A Decline in Courage [. . .]

May be the most striking feature which an outside observer notices in the West in our days. The Western world has lost its civil courage, both as a whole and separately, in each country, each government, each political party and of course in the United Nations. Such a decline in courage is particularly noticeable among the ruling groups and the intellectual elite, causing an impression of loss of courage by the entire society. Of course there are many courageous individuals but they have no determining influence on public life. Political and intellectual bureaucrats show depression, passivity and perplexity in their actions and in their statements and even more so in theoretical reflections to explain how realistic, reasonable as well as intellectually and even morally warranted it is to base state policies on weakness and cowardice. And decline in courage is ironically emphasized by occasional explosions of anger and inflexibility on the part of the same bureaucrats when dealing with weak governments and weak countries, not supported by anyone, or with currents which cannot offer any resistance. But they get tongue-tied and paralyzed when they deal with powerful governments and threatening forces, with aggressors and international terrorists.

Should one point out that from ancient times decline in courage has been considered the beginning of the end?

Well-Being

When the modern Western States were created, the following principle was proclaimed: governments are meant to serve man, and man lives to be free to pursue happiness. (See, for example, the American Declaration). Now at last during past decades technical and social progress has permitted the realization of such aspirations: the welfare state. Every citizen has been granted the desired freedom and material goods in such quantity and of such quality as to guarantee in theory the achievement of happiness, in the morally inferior sense which has come into being during those same decades. In the process, however, one psychological detail has been overlooked: the constant desire to have still more things and a still better life and the struggle to obtain them imprints many Western faces with worry and even depression, though it is customary to conceal such feelings. Active and tense competition permeates all human thoughts without opening a way to free spiritual development. The individual’s independence from many types of state pressure has been guaranteed; the majority of people have been granted well-being to an extent their fathers and grandfathers could not even dream about; it has become possible to raise young people according to these ideals, leading them to physical splendor, happiness, possession of material goods, money and leisure, to an almost unlimited freedom of enjoyment. So who should now renounce all this, why and for what should one risk one’s precious life in defense of common values, and particularly in such nebulous cases when the security of one’s nation must be defended in a distant country?

Even biology knows that habitual extreme safety and well-being are not advantageous for a living organism. Today, well-being in the life of Western society has begun to reveal its pernicious mask.

Legalistic Life

Western society has given itself the organization best suited to its purposes, based, I would say, on the letter of the law. The limits of human rights and righteousness are determined by a system of laws; such limits are very broad. People in the West have acquired considerable skill in using, interpreting and manipulating law, even though laws tend to be too complicated for an average person to understand without the help of an expert. Any conflict is solved according to the letter of the law and this is considered to be the supreme solution. If one is right from a legal point of view, nothing more is required, nobody may mention that one could still not be entirely right, and urge self-restraint, a willingness to renounce such legal rights, sacrifice and selfless risk: it would sound simply absurd. One almost never sees voluntary self-restraint. Everybody operates at the extreme limit of those legal frames. An oil company is legally blameless when it purchases an invention of a new type of energy in order to prevent its use. A food product manufacturer is legally blameless when he poisons his produce to make it last longer: after all, people are free not to buy it.

I have spent all my life under a communist regime and I will tell you that a society without any objective legal scale is a terrible one indeed. But a society with no other scale but the legal one is not quite worthy of man either. A society which is based on the letter of the law and never reaches any higher is taking very scarce advantage of the high level of human possibilities. The letter of the law is too cold and formal to have a beneficial influence on society. Whenever the tissue of life is woven of legalistic relations, there is an atmosphere of moral mediocrity, paralyzing man’s noblest impulses.

And it will be simply impossible to stand through the trials of this threatening century with only the support of a legalistic structure.

The Direction of Freedom

In today’s Western society, the inequality has been revealed of freedom for good deeds and freedom for evil deeds. A statesman who wants to achieve something important and highly constructive for his country has to move cautiously and even timidly; there are thousands of hasty and irresponsible critics around him, parliament and the press keep rebuffing him. As he moves ahead, he has to prove that every single step of his is well-founded and absolutely flawless. Actually an outstanding and particularly gifted person who has unusual and unexpected initiatives in mind hardly gets a chance to assert himself; from the very beginning, dozens of traps will be set out for him. Thus mediocrity triumphs with the excuse of restrictions imposed by democracy.

It is feasible and easy everywhere to undermine administrative power and, in fact, it has been drastically weakened in all Western countries. The defense of individual rights has reached such extremes as to make society as a whole defenseless against certain individuals. It is time, in the West, to defend not so much human rights as human obligations.

Destructive and irresponsible freedom has been granted boundless space. Society appears to have little defense against the abyss of human decadence, such as, for example, misuse of liberty for moral violence against young people, motion pictures full of pornography, crime and horror. It is considered to be part of freedom and theoretically counter-balanced by the young people’s right not to look or not to accept. Life organized legalistically has thus shown its inability to defend itself against the corrosion of evil.

And what shall we say about the dark realm of criminality as such? Legal frames (especially in the United States) are broad enough to encourage not only individual freedom but also certain individual crimes. The culprit can go unpunished or obtain undeserved leniency with the support of thousands of public defenders. When a government starts an earnest fight against terrorism, public opinion immediately accuses it of violating the terrorists’ civil rights. There are many such cases.

Such a tilt of freedom in the direction of evil has come about gradually but it was evidently born primarily out of a humanistic and benevolent concept according to which there is no evil inherent to human nature; the world belongs to mankind and all the defects of life are caused by wrong social systems which must be corrected. Strangely enough, though the best social conditions have been achieved in the West, there still is criminality and there even is considerably more of it than in the pauper and lawless Soviet society. (There is a huge number of prisoners in our camps which are termed criminals, but most of them never committed any crime; they merely tried to defend themselves against a lawless state resorting to means outside of a legal framework).

The Direction of the Press

The press too, of course, enjoys the widest freedom. (I shall be using the word press to include all media). But what sort of use does it make of this freedom?

Here again, the main concern is not to infringe the letter of the law. There is no moral responsibility for deformation or disproportion. What sort of responsibility does a journalist have to his readers, or to history? If they have misled public opinion or the government by inaccurate information or wrong conclusions, do we know of any cases of public recognition and rectification of such mistakes by the same journalist or the same newspaper? No, it does not happen, because it would damage sales. A nation may be the victim of such a mistake, but the journalist always gets away with it. One may safely assume that he will start writing the opposite with renewed self-assurance.

Because instant and credible information has to be given, it becomes necessary to resort to guesswork, rumors and suppositions to fill in the voids, and none of them will ever be rectified, they will stay on in the readers’ memory. How many hasty, immature, superficial and misleading judgments are expressed every day, confusing readers, without any verification. The press can both simulate public opinion and miseducate it. Thus we may see terrorists heroized, or secret matters, pertaining to one’s nation’s defense, publicly revealed, or we may witness shameless intrusion on the privacy of well-known people under the slogan: “everyone is entitled to know everything.” But this is a false slogan, characteristic of a false era: people also have the right not to know, and it is a much more valuable one. The right not to have their divine souls stuffed with gossip, nonsense, vain talk. A person who works and leads a meaningful life does not need this excessive burdening flow of information.

Hastiness and superficiality are the psychic disease of the 20th century and more than anywhere else this disease is reflected in the press. In-depth analysis of a problem is anathema to the press. It stops at sensational formulas.

Such as it is, however, the press has become the greatest power within the Western countries, more powerful than the legislature, the executive and the judiciary. One would then like to ask: by what law has it been elected and to whom is it responsible? In the communist East a journalist is frankly appointed as a state official. But who has granted Western journalists their power, for how long a time and with what prerogatives?

There is yet another surprise for someone coming from the East where the press is rigorously unified: one gradually discovers a common trend of preferences within the Western press as a whole. It is a fashion; there are generally accepted patterns of judgment and there may be common corporate interests, the sum effect being not competition but unification. Enormous freedom exists for the press, but not for the readership because newspapers mostly give enough stress and emphasis to those opinions which do not too openly contradict their own and the general trend.

A Fashion in Thinking

Without any censorship, in the West fashionable trends of thought and ideas are carefully separated from those which are not fashionable; nothing is forbidden, but what is not fashionable will hardly ever find its way into periodicals or books or be heard in colleges. Legally your researchers are free, but they are conditioned by the fashion of the day. There is no open violence such as in the East; however, a selection dictated by fashion and the need to match mass standards frequently prevent independent-minded people from giving their contribution to public life. There is a dangerous tendency to form a herd, shutting off successful development. I have received letters in America from highly intelligent persons, maybe a teacher in a faraway small college who could do much for the renewal and salvation of his country, but his country cannot hear him because the media are not interested in him. This gives birth to strong mass prejudices, blindness, which is most dangerous in our dynamic era. There is, for instance, a self-deluding interpretation of the contemporary world situation. It works as a sort of petrified armor around people’s minds. Human voices from 17 countries of Eastern Europe and Eastern Asia cannot pierce it. It will only be broken by the pitiless crowbar of events.

I have mentioned a few trends of Western life which surprise and shock a new arrival to this world. The purpose and scope of this speech will not allow me to continue such a review, to look into the influence of these Western characteristics on important aspects on [the] nation’s life, such as elementary education, advanced education in [?…]

Socialism

It is almost universally recognized that the West shows all the world a way to successful economic development, even though in the past years it has been strongly disturbed by chaotic inflation. However, many people living in the West are dissatisfied with their own society. They despise it or accuse it of not being up to the level of maturity attained by mankind. A number of such critics turn to socialism, which is a false and dangerous current.

I hope that no one present will suspect me of offering my personal criticism of the Western system to present socialism as an alternative. Having experienced applied socialism in a country where the alternative has been realized, I certainly will not speak for it. The well-known Soviet mathematician Shafarevich, a member of the Soviet Academy of Science, has written a brilliant book under the title Socialism; it is a profound analysis showing that socialism of any type and shade leads to a total destruction of the human spirit and to a leveling of mankind into death. Shafarevich’s book was published in France almost two years ago and so far no one has been found to refute it. It will shortly be published in English in the United States.

Not a Model

But should someone ask me whether I would indicate the West such as it is today as a model to my country, frankly I would have to answer negatively. No, I could not recommend your society in its present state as an ideal for the transformation of ours. Through intense suffering our country has now achieved a spiritual development of such intensity that the Western system in its present state of spiritual exhaustion does not look attractive. Even those characteristics of your life which I have just mentioned are extremely saddening.

A fact which cannot be disputed is the weakening of human beings in the West while in the East they are becoming firmer and stronger. Six decades for our people and three decades for the people of Eastern Europe; during that time we have been through a spiritual training far in advance of Western experience. Life’s complexity and mortal weight have produced stronger, deeper and more interesting characters than those produced by standardized Western well-being. Therefore if our society were to be transformed into yours, it would mean an improvement in certain aspects, but also a change for the worse on some particularly significant scores. It is true, no doubt, that a society cannot remain in an abyss of lawlessness, as is the case in our country. But it is also demeaning for it to elect such mechanical legalistic smoothness as you have. After the suffering of decades of violence and oppression, the human soul longs for things higher, warmer and purer than those offered by today’s mass living habits, introduced by the revolting invasion of publicity, by TV stupor and by intolerable music.

All this is visible to observers from all the worlds of our planet. The Western way of life is less and less likely to become the leading model.

There are meaningful warnings that history gives a threatened or perishing society. Such are, for instance, the decadence of art, or a lack of great statesmen. There are open and evident warnings, too. The center of your democracy and of your culture is left without electric power for a few hours only, and all of a sudden crowds of American citizens start looting and creating havoc. The smooth surface film must be very thin, then, the social system quite unstable and unhealthy.

But the fight for our planet, physical and spiritual, a fight of cosmic proportions, is not a vague matter of the future; it has already started. The forces of Evil have begun their decisive offensive, you can feel their pressure, and yet your screens and publications are full of prescribed smiles and raised glasses. What is the joy about?

Shortsightedness

Very well known representatives of your society, such as George Kennan, say: we cannot apply moral criteria to politics. Thus we mix good and evil, right and wrong and make space for the absolute triumph of absolute Evil in the world. On the contrary, only moral criteria can help the West against communism’s well planned world strategy. There are no other criteria. Practical or occasional considerations of any kind will inevitably be swept away by strategy. After a certain level of the problem has been reached, legalistic thinking induces paralysis; it prevents one from seeing the size and meaning of events.

In spite of the abundance of information, or maybe because of it, the West has difficulties in understanding reality such as it is. There have been naive predictions by some American experts who believed that Angola would become the Soviet Union’s Vietnam or that Cuban expeditions in Africa would best be stopped by special U.S. courtesy to Cuba. Kennan’s advice to his own country — to begin unilateral disarmament — belongs to the same category. If you only knew how the youngest of the Moscow Old Square [1] officials laugh at your political wizards! As to Fidel Castro, he frankly scorns the United States, sending his troops to distant adventures from his country right next to yours.

However, the most cruel mistake occurred with the failure to understand the Vietnam war. Some people sincerely wanted all wars to stop just as soon as possible; others believed that there should be room for national, or communist, self-determination in Vietnam, or in Cambodia, as we see today with particular clarity. But members of the U.S. anti-war movement wound up being involved in the betrayal of Far Eastern nations, in a genocide and in the suffering today imposed on 30 million people there. Do those convinced pacifists hear the moans coming from there? Do they understand their responsibility today? Or do they prefer not to hear? The American Intelligentsia lost its [nerve] and as a consequence thereof danger has come much closer to the United States. But there is no awareness of this. Your shortsighted politicians who signed the hasty Vietnam capitulation seemingly gave America a carefree breathing pause; however, a hundredfold Vietnam now looms over you. That small Vietnam had been a warning and an occasion to mobilize the nation’s courage. But if a full-fledged America suffered a real defeat from a small communist half-country, how can the West hope to stand firm in the future?

I have had occasion already to say that in the 20th century democracy has not won any major war without help and protection from a powerful continental ally whose philosophy and ideology it did not question. In World War II against Hitler, instead of winning that war with its own forces, which would certainly have been sufficient, Western democracy grew and cultivated another enemy who would prove worse and more powerful yet, as Hitler never had so many resources and so many people, nor did he offer any attractive ideas, or have such a large number of supporters in the West — a potential fifth column — as the Soviet Union. At present, some Western voices already have spoken of obtaining protection from a third power against aggression in the next world conflict, if there is one; in this case the shield would be China. But I would not wish such an outcome to any country in the world. First of all, it is again a doomed alliance with Evil; also, it would grant the United States a respite, but when at a later date China with its billion people would turn around armed with American weapons, America itself would fall prey to a genocide similar to the one perpetrated in Cambodia in our days.

Loss of Willpower

And yet — no weapons, no matter how powerful, can help the West until it overcomes its loss of willpower. In a state of psychological weakness, weapons become a burden for the capitulating side. To defend oneself, one must also be ready to die; there is little such readiness in a society raised in the cult of material well-being. Nothing is left, then, but concessions, attempts to gain time and betrayal. Thus at the shameful Belgrade conference free Western diplomats in their weakness surrendered the line where enslaved members of Helsinki Watchgroups are sacrificing their lives.

Western thinking has become conservative: the world situation should stay as it is at any cost, there should be no changes. This debilitating dream of a status quo is the symptom of a society which has come to the end of its development. But one must be blind in order not to see that oceans no longer belong to the West, while land under its domination keeps shrinking. The two so-called world wars (they were by far not on a world scale, not yet) have meant internal self-destruction of the small, progressive West which has thus prepared its own end. The next war (which does not have to be an atomic one and I do not believe it will) may well bury Western civilization forever.

Facing such a danger, with such historical values in your past, at such a high level of realization of freedom and apparently of devotion to freedom, how is it possible to lose to such an extent the will to defend oneself?

Humanism and Its Consequences

How has this unfavorable relation of forces come about? How did the West decline from its triumphal march to its present sickness? Have there been fatal turns and losses of direction in its development? It does not seem so. The West kept advancing socially in accordance with its proclaimed intentions, with the help of brilliant technological progress. And all of a sudden it found itself in its present state of weakness.

This means that the mistake must be at the root, at the very basis of human thinking in the past centuries. I refer to the prevailing Western view of the world which was first born during the Renaissance and found its political expression from the period of the Enlightenment. It became the basis for government and social science and could be defined as rationalistic humanism or humanistic autonomy: the proclaimed and enforced autonomy of man from any higher force above him. It could also be called anthropocentricity, with man seen as the center of everything that exists.

The turn introduced by the Renaissance evidently was inevitable historically. The Middle Ages had come to a natural end by exhaustion, becoming an intolerable despotic repression of man’s physical nature in favor of the spiritual one. Then, however, we turned our backs upon the Spirit and embraced all that is material with excessive and unwarranted zeal. This new way of thinking, which had imposed on us its guidance, did not admit the existence of intrinsic evil in man nor did it see any higher task than the attainment of happiness on earth. It based modern Western civilization on the dangerous trend to worship man and his material needs. Everything beyond physical well-being and accumulation of material goods, all other human requirements and characteristics of a subtler and higher nature, were left outside the area of attention of state and social systems, as if human life did not have any superior sense. That provided access for evil, of which in our days there is a free and constant flow. Merely freedom does not in the least solve all the problems of human life and it even adds a number of new ones.

However, in early democracies, as in American democracy at the time of its birth, all individual human rights were granted because man is God’s creature. That is, freedom was given to the individual conditionally, in the assumption of his constant religious responsibility. Such was the heritage of the preceding thousand years. Two hundred or even fifty years ago, it would have seemed quite impossible, in America, that an individual could be granted boundless freedom simply for the satisfaction of his instincts or whims. Subsequently, however, all such limitations were discarded everywhere in the West; a total liberation occurred from the moral heritage of Christian centuries with their great reserves of mercy and sacrifice. State systems were becoming increasingly and totally materialistic. The West ended up by truly enforcing human rights, sometimes even excessively, but man’s sense of responsibility to God and society grew dimmer and dimmer. In the past decades, the legalistically selfish aspect of Western approach and thinking has reached its final dimension and the world wound up in a harsh spiritual crisis and a political impasse. All the glorified technological achievements of Progress, including the conquest of outer space, do not redeem the Twentieth century’s moral poverty which no one could imagine even as late as in the Nineteenth Century.

An Unexpected Kinship

As humanism in its development became more and more materialistic, it made itself increasingly accessible to speculation and manipulation at first by socialism and then by communism. So that Karl Marx was able to say in 1844 that “communism is naturalized humanism.”

This statement turned out not to be entirely senseless. One does see the same stones in the foundations of a despiritualized humanism and of any type of socialism: endless materialism; freedom from religion and religious responsibility, which under communist regimes reach the stage of anti-religious dictatorship; concentration on social structures with a seemingly scientific approach. (This is typical of the Enlightenment in the Eighteenth Century and of Marxism). Not by coincidence all of communism’s meaningless pledges and oaths are about Man, with a capital M, and his earthly happiness. At first glance it seems an ugly parallel: common traits in the thinking and way of life of today’s West and today’s East? But such is the logic of materialistic development.

The interrelationship is such, too, that the current of materialism which is most to the left always ends up by being stronger, more attractive and victorious, because it is more consistent. Humanism without its Christian heritage cannot resist such competition. We watch this process in the past centuries and especially in the past decades, on a world scale as the situation becomes increasingly dramatic. Liberalism was inevitably displaced by radicalism, radicalism had to surrender to socialism and socialism could never resist communism. The communist regime in the East could stand and grow due to the enthusiastic support from an enormous number of Western intellectuals who felt a kinship and refused to see communism’s crimes. When they no longer could do so, they tried to justify them. In our Eastern countries, communism has suffered a complete ideological defeat; it is zero and less than zero. But Western intellectuals still look at it with interest and with empathy, and this is precisely what makes it so immensely difficult for the West to withstand the East.

Before the Turn

I am not examining here the case of a world war disaster and the changes which it would produce in society. As long as we wake up every morning under a peaceful sun, we have to lead an everyday life. There is a disaster, however, which has already been under way for quite some time. I am referring to the calamity of a despiritualized and irreligious humanistic consciousness.

To such consciousness, man is the touchstone in judging and evaluating everything on earth. Imperfect man, who is never free of pride, self-interest, envy, vanity, and dozens of other defects. We are now experiencing the consequences of mistakes which had not been noticed at the beginning of the journey. On the way from the Renaissance to our days we have enriched our experience, but we have lost the concept of a Supreme Complete Entity which used to restrain our passions and our irresponsibility. We have placed too much hope in political and social reforms, only to find out that we were being deprived of our most precious possession: our spiritual life. In the East, it is destroyed by the dealings and machinations of the ruling party. In the West, commercial interests tend to suffocate it. This is the real crisis. The split in the world is less terrible than the similarity of the disease plaguing its main sections.

If humanism were right in declaring that man is born to be happy, he would not be born to die. Since his body is doomed to die, his task on earth evidently must be of a more spiritual nature. It cannot unrestrained enjoyment of everyday life. It cannot be the search for the best ways to obtain material goods and then cheerfully get the most out of them. It has to be the fulfillment of a permanent, earnest duty so that one’s life journey may become an experience of moral growth, so that one may leave life a better human being than one started it. It is imperative to review the table of widespread human values. Its present incorrectness is astounding. It is not possible that assessment of the President’s performance be reduced to the question of how much money one makes or of unlimited availability of gasoline. Only voluntary, inspired self-restraint can raise man above the world stream of materialism.

It would be retrogression to attach oneself today to the ossified formulas of the Enlightenment. Social dogmatism leaves us completely helpless in front of the trials of our times.

Even if we are spared destruction by war, our lives will have to change if we want to save life from self-destruction. We cannot avoid revising the fundamental definitions of human life and human society. Is it true that man is above everything? Is there no Superior Spirit above him? Is it right that man’s life and society’s activities have to be determined by material expansion in the first place? Is it permissible to promote such expansion to the detriment of our spiritual integrity?

If the world has not come to its end, it has approached a major turn in history, equal in importance to the turn from the Middle Ages to the Renaissance. It will exact from us a spiritual upsurge, we shall have to rise to a new height of vision, to a new level of life where our physical nature will not be cursed as in the Middle Ages, but, even more importantly, our spiritual being will not be trampled upon as in the Modern era.

This ascension will be similar to climbing onto the next anthropologic stage. No one on earth has any other way left but — upward.

Notes

[1] The Old Square in Moscow (Staraya Ploshchad’) is the place where the [headquarters] of the Central Committee of the CPSU are located; it is the real name of what in the West is conventionally referred to as “the Kremlin.”

Source: Texts of Famous Speeches at Harvard

Onde está a verdadeira crise da Igreja ~ Leonardo Boff

A crise da pedofilia na Igreja romano-católica não é nada em comparação à verdadeira crise, essa sim, estrutural, crise que concerne à sua institucionalidade histórico-social. Não me refiro à Igreja como comunidade de fiéis. Esta continua viva apesar da crise, se organizando de forma comunitária e não piramidal como a Igreja da Tradição. A questão é: que tipo de instituição representa esta comunidade de fé? Como se organiza? Atualmente, ela comparece como defasada da cultura contemporânea e em forte contradição com o sonho de Jesus, percebida pelas comunidades que se acostumaram a ler os envangelhos em grupos e então a fazer a suas analises.

Dito de forma breve mas não caricata: a instituição-Igreja se sustenta sobre duas formas de poder: um secular, organizativo, jurídico e hierárquico, herdado do Império Romano e outro espiritual, assentado sobre a teologia política de Santo Agostinho acerca da Cidade de Deus que ele identifica com a instituição-Igreja. Em sua montagem concreta não é tanto o Evangelho ou a fé cristã que contam, mas estes poderes, considerados como um único “poder sagrado” (potestas sacra) também na forma de sua plenitude (plenitudo potestatis) no estilo imperial romano da monarquia absolutista. César detinha todo o poder: político, militar, jurídico e religioso. O Papa, semelhantemente detém igual poder: “ordinário, supremo, pleno, imediato e universal” (canon 331), atributos só cabíveis a Deus. O Papa institucionalmente é um César batizado.

Esse poder que estrutura a instituição-Igreja foi se constituindo a partir do ano 325 com Imperador Constantino e oficialmente instaurado em 392 quando Teodósio, o Grande (+395) impôs o cristianismo como a única religião de Estado. A instituição-Igreja assumiu esse poder com todos os títulos, honrarias e hábitos palacianos que perduram até os dias de hoje no estilo de vida dos bispos, cardeais e papas.

Esse poder ganhou, com o tempo, formas cada vez mais totalitárias e até tirânicas, especialmente a partir do Papa Gregório VII que em 1075 se autoproclamou senhor absoluto da Igreja e do mundo. Radicalizando, Inocêncio III (+1216) se apresentou não apenas como sucessor de Pedro mas como representante de Cristo. Seu sucessor, Inocêncio IV(+1254), deu o último passo e se anunciou como representante de Deus e por isso senhor universal da Terra que podia distribuir porções dela a quem quisesse, como depois foi feito aos reis de Espanha e Portugal no século XVI. Só faltava proclamar Papa infalível, o que ocorreu sob Pio IX em 1870. O circulo se fechou.

Ora, este tipo de instituição encontra-se hoje num profundo processo de erosão. Depois de mais de 40 anos de continuado estudo e meditação sobre a Igreja (meu campo de especialização) suspeito que chegou o momento crucial para ela: ou corajosamente muda e assim encontra seu lugar no mundo moderno e metaboliza o processo acelerado de globalização e ai terá muito a dizer, ou se condena a ser uma seita ocidental, cada vez mais irrelevante e esvaziada de fiéis. O projeto atual de Bento XVI de “reconquista” da visibilidade da Igreja contra o mundo secular é fadado ao fracasso se não proceder a uma mudança institucional. As pessoas de hoje não aceitam mais uma Igreja autoritária e triste como se fosse ao próprio enterro. Mas estão abertas à saga de Jesus, ao seu sonho e aos valores evangélicos.

Esse crescendo na vontade de poder, imaginado ilusoriamente vindo diretamente de Cristo, impede qualquer reforma da instituição-Igreja, pois tudo nela seria divino e intocável. Realiza-se plenamente a lógica do poder, descrita por Hobbes em seu Leviatã: “o poder quer sempre mais poder, porque não se pode garantir o poder senão buscando mais e mais poder”. Uma instituição-Igreja que busca assim um poder absoluto fecha as portas ao amor e se distancia dos sem-poder, dos pobres. A instituição perde o rosto humano e se faz insensível aos problemas existenciais, como da família e da sexualidade.

O Concílio Vaticano II (1965) procurou curar este desvio pelos conceitos de Povo de Deus, de comunhão e de governo colegial. Mas o intento foi abortado por João Paulo II e Bento XVI que voltaram a insistir no centralismo romano, agravando a crise.

O que um dia foi construído pode ser num outro, desconstruído. A fé cristã possui força intrínseca de nesta fase planetária encontrar uma forma institucional mais adequada ao sonho de seu Fundador e mais consentânea ao nosso tempo.

Fonte: Adital, 12 jul 2010

Poder y libertad en la sociedad del conocimiento

Todos los progresos humanos van acompañados de una sombra en donde se cultiva el imaginario de los desastres. A medida que avanza el saber no disminuye el temor a una secreta amenaza que se aloja, precisamente, emboscada tras ese saber. Cada vez tenemos más poder para viajar, comunicarnos, conocer, hacer valer nuestra opinión, pero cada vez resulta más fascinante la sospecha de que ese poder es ilusorio y más grato a nuestros oídos el discurso que denuncia medidas represivas de poderosas instituciones contra el individuo desvalido. Todavía hoy es convincente el discurso contra la opresión de instituciones más grandes y más poderosas (estado, educación, medios de comunicación o medicina) contra el individuo, representado como una persona inerme (ciudadano, trabajador, elector, alumno, paciente). Las descripciones apocalípticas de la sociedad contemporánea nos han acostumbrado a imaginar víctimas impotentes, consumidores manipulados, turistas engañados, votantes confusos y trabajadores ignorantes. En este panorama la ciencia y la técnica son desenmascaradas como cómplices de los poderosos o como instrumento de una clase que ejerce una nueva represión. Si estas denuncias, además de fascinantes fueran verdaderas, se daría la paradoja de que cuanto más racional es la sociedad, más irracional es la política.

La noción de la sociedad del conocimiento que aquí voy a esbozar es incompatible con aquella credibilidad o ingenuidad científica que consideraba el saber científico como algo ilimitado, tanto como las posibilidades de manipulación de la realidad social. No comparto la utopía —para unos positiva, para otros terrorífica— de la racionalización completa de la irracionalidad, de la desaparición de las identidades locales, de la destrucción de otras formas de saber que podríamos considerar no científicas o tradicionales. Es cierto que no hay apenas realidad social, económica o cultural que sea inmune frente al saber científico y técnico. Pero la significación sin precedentes del saber científico en nuestras sociedades no supone la supresión de todas las otras formas de vida y actitudes.

Trataré de defender una opinión que sin ser muy grata a los traficantes de grandes expectativas —en versión optimista o pesimista— me parece más razonable que su contraria: la sociedad del conocimiento encierra más posibilidades de libertad personal que todas las formas sociales precedentes. Esa libertad es, en buena medida, el reverso del hecho de que, por fortuna o por desgracia, los hombres no podamos hacer mucho bien ni causar mucho mal. Y es que hay un exceso de confianza en la ciencia y en la técnica tanto en quienes esperan de ellas la solución de todos los problemas como en quienes les atribuyen la responsabilidad de todas las desgracias, aun de las hipotéticas. La vida no es fácilmente maleable, no se adapta tan bien a la técnica como desean sus entusiastas y temen sus detractores. Existen muchos límites y obstáculos para la aplicación de la ciencia a la realidad, algunos superables y otros que afortunadamente no parecen condenados a desaparecer. De hecho, el crecimiento y la expansión de la ciencia no están necesariamente acompañados de una reducción de la incertidumbre, del riesgo y la imprevisibilidad. Por eso, en las sociedades actuales, el problema es más bien la gobernabilidad de entramados tan complejos, la antítesis más rotunda de esa sociedad manejable de manera conspirativa en la que se desarrolla la nueva ciber-épica.

a. La crítica de la civilización tecnológica y científica

En los años sesenta, teóricos de la sociedad de muy diversa orientación política —desde conservadores hasta neo-marxistas, desde Schelsky (1961) a Marcuse [1964]— llevaron a cabo una crítica implacable de la civilización tecnológica y científica, denunciando el despliegue inminente de una cultura regida por la ciencia y el peligro de un estado técnico. En todos ellos se lamentaba la pérdida de individualidad del hombre moderno. El tono general de estas críticas consistía en ver la racionalidad instrumental como origen de manipulación y control social. Eran tiempos muy propicios para diseñar futuros escenarios sombríos: la ciencia parecía haber transformado la pesadilla apocalíptica de una destrucción del mundo en una posibilidad concreta. Se presagiaban leyes evolutivas de diferenciación imparable, disminución de la capacidad operativa de los actores individuales, de elaborar su propia opinión y defender su identidad, motivos conspirativos de élites que ocultan sistemáticamente sus intereses, amenaza de la autonomía personal, estructuras represivas, descomposición de la esfera privada, control extremadamente eficiente sobre todos los ámbitos de la vida, introducción de prescripciones cada vez más numerosas y detalladas, reglamentación creciente…

Desde entonces quedó inaugurada la ocupación tópica de criticar el poder creciente de la ciencia y la técnica. La competición por el epíteto más atinado daba por supuesto un destinatario identificable. Los discursos más imaginativos lograron fórmulas como el imperialismo amenazante de la razón instrumental (Weizenbaum), el peligro de una agresiva colonización del mundo de la vida (Habermas) o la inevitabilidad de una nueva taylorización del mundo del trabajo (Volpert). En este contexto se desarrollaron tesis como la de Bell (1960) del final de las ideologías o el pronóstico de Robert Lane (1966) de que nos encontrábamos al comienzo de una nueva era en que los conocimientos científicos reducirían la significación de lo político. Al mismo tiempo se anunciaba la constitución de un tipo de formaciones sociales que fueron denunciadas como “Estado técnico” o “civilización científico-técnica” (Mumford 1962; Schelsky 1961), y que posteriormente sería denominada con mayor sutilidad como “sociedad registradora” (G. Böhme 1984, 15) en la que el poder dispone de una enorme cantidad de datos sobre los ciudadanos.

Estos y otros análisis similares de la misma época padecían una equivocada confianza en la eficacia práctica de la técnica y de la ciencia. Mirando hacia atrás puede hoy decirse que después de veinticinco años de teoría de la sociedad postindustrial nos hemos hecho más precavidos y escépticos. No se han cumplido ni las expectativas tecnocráticas ni las esperanzas humanistas. Quizás sea cierta la observación de Jean Jacques Salomon (1973, 60) y el mito del progreso humano a través del progreso de la ciencia sea superado paradójicamente por ese mismo progreso.

La crítica de la ciencia que se ha hecho ya tópica merece alguna revisión, entre otras cosas porque surge en buena medida de una ciencia malentendida. El poder social de la ciencia y de la técnica no determina causalmente todos los aspectos y fases de la vida humana, como temen o esperan quienes ven en esta determinación un destino inexorable de la modernidad. Esta suposición se apoya en una equivocada comprensión del poder social del conocimiento científico; no tiene en cuenta que también en las sociedades modernas hay límites para el saber científico. Ya Max Weber y Karl Manheim llamaron la atención sobre el hecho de que el proceso capitalista-racionalista tenía sus límites y sólo era capaz de imponerse en determinadas dimensiones.

Los efectos dramáticos de la ciencia sobre el mundo de la vida no implican necesariamente que todos interioricen una visión científica del mundo, que el sentido común sea sustituido por el pensar científico, que el poder político sea ejercido de una manera central y autoritaria, que no existan límites para la realización e implementación del saber científico o que esas realizaciones estén exentas de riesgo. La planificación también podría conducir a un aumento de flexibilidad, de acciones alternativas, de consecuencias prácticas no anticipables, etc. que no justifican los temores frente a un tipo de control calculador.

Por otra parte, el concepto de técnica aquí manejado contiene algunas premisas cuestionables. En primer lugar, se da por supuesto que los procesos sociales tienen una especie de ilimitada elasticidad y maleabilidad frente a la lógica de la técnica. Esta idea se basa en la dudosa tesis de una radical disponibilidad de la historia que obedeciera dócilmente a nuestros objetivos técnicos. En segundo lugar, el desarrollo técnico es concebido como un proceso autónomo, que se sostiene por sí mismo. Pero es muy improbable, a mi juicio, que el desarrollo de la técnica esté impulsado exclusivamente por una singular lógica autorreferencial de crecimiento, a saber, la de la mejor o más eficiente solución de un problema concreto. Más bien ocurre que preferencias que no son de carácter técnico hacen posible la mejora de un proceso, por ejemplo, que una de las soluciones técnicas posibles sea considerada como la mejor y llevada así a la práctica (Krohn y Rammert 1985). La introducción de nuevas tecnologías o la renuncia a nuevos desarrollos técnicos no se decide exclusivamente según criterios técnicos. La técnica no se impone absolutamente cuando los criterios para preferir una determinada solución técnica están en otras esferas de la vida, lo que parece ocurrir cuando la decisión se adopta conforme a oportunidades políticas, estéticas o morales.

Uno de los principales presupuestos de la ciencia moderna era su capacidad sustitutoria de los demás saberes. Los partidarios y los enemigos de la ciencia y la técnica modernas compartían el convencimiento de que el saber científico eliminaba el saber de cualquier otro tipo (Marcuse [1964]; Schelsky 1965; Bell 1973). Consideraban que las convicciones tradicionales o irracionales serían disueltas por una racionalización de la acción social. También las primeras teorías de la sociedad del conocimiento estaban marcadas por el peso de la concepción positivista de la ciencia. Lane (1966) reflejaba el optimismo de comienzos de los años sesenta cuando expresaba su convencimiento de que el pensamiento científico disolvería y sustituiría radicalmente al saber anterior, declarándolo inapropiado o incluso irracional. Pero esta supuesta eliminación gradual de las seguridades, identidades, ideologías y expectativas tradicionales es más un deseo o un temor que una realidad efectiva. La ciencia y la técnica aseguran también la supervivencia de formas de acción existentes; en cierto sentido podría incluso decirse que son responsables de que muchos modos convencionales de pensar y actuar no pierdan su validez. Cuando se analizan las cosas con menos entusiasmo o temor, el conocimiento científico pierde su vinculación con el determinismo positivista y aquella lógica que podríamos llamar “sustituista”.

Otro de los lugares comunes de la crítica a la civilización técnica y científica es la supuestamente imparable concentración de poder, que se hace patente en la sofisticación del control sobre la sociedad. En última instancia, las nuevas tecnologías vendrían a fortalecer las condiciones de aquel panopticum ensalzado por Bentham en 1791 como instancia de control (Foucault 1975). Es indudable que con las nuevas tecnologías de la información la vigilancia puede ser organizada de manera mucho más eficiente que en las sociedades premodernas (Giddens 1990, 22). Pero queda abierta la cuestión de si la sociedad actual derivará hacia un estado autoritario perfectamente organizado o si más bien esa misma evolución establecerá la posibilidad de una democratización radical. Por un lado, determinadas técnicas pueden poner en marcha un desarrollo alarmante porque, como muchos temen, posibilitan una vigilancia centralizada y perfecta. Y simultáneamente ese desarrollo técnico es el que permite un alto grado de descentralización, iniciativas locales, estancias flexibles e incluso una vigilancia efectiva y asequible sobre los vigilantes.

Las constricciones sociales específicas de una sociedad del conocimiento no son las mismas que las analizadas por las teorías tradicionales de las relaciones de poder en general y del poder político en particular. En el concepto tradicional de poder su posesión y su uso son conscientemente pretendidos; las responsabilidades pueden ser asignadas, las utilidades o los costes del ejercicio del poder están por lo general claramente repartidos y resultan calculables. Pero cualquier investigación acerca del ejercicio del poder en una sociedad del conocimiento ha de tomar como punto de partida una difuminación de los centros de decisión en nuestras sociedades, así como el hecho de que ha cambiado sustancialmente el tipo de poder que proporciona el conocimiento, si se lo compara con el que se esperaba de la ciencia y la técnica en los orígenes de la modernidad.

En las sociedades del conocimiento la acción humana está fuertemente condicionada por las circunstancias que se siguen del saber científico y de los artefactos técnicos. Pero, al mismo tiempo, también ocurre que las formas de pensar y de actuar en esa sociedad pueden ser más efectivamente protegidas frente al influjo de la ciencia, en la medida en que se mejoran decisivamente las condiciones de posibilidad para dicha resistencia. La influencia creciente de la ciencia y de la técnica discurre al mismo tiempo que una elevada contingencia y fragilidad de la acción social, y no conduce en absoluto a una superación definitiva de la “irracionalidad” en virtud de la “racionalidad” producida por la ciencia.

Lo que caracteriza principalmente a la sociedad del conocimiento es el hecho de que la ciencia y la técnica proporcionan posibilidades de acción para un número creciente de autores, que incluso perfeccionan decisivamente la resistencia contra una homogeneización del comportamiento en esa sociedad. La ciencia y la técnica multiplican e intensifican las posibilidades de oposición frente a las evoluciones que ellas mismas han desatado. No solamente configuran poderes que limitan las posibilidades de elección, despliegan controles más eficaces y solidifican las relaciones de dominación y desigualdades existentes; gracias a ese mismo saber es posible ampliar las posibilidades de acción, influir sobre los poderosos, desmitificar autoridades, configurar nuevos grupos y autores. Por lo que se refiere al poder, no debería considerarse el saber sólo como un medio de coerción —tal como aparece al menos implícitamente en muchas concepciones del poder— sino también como una posibilidad de defenderse frente a él, de organizar oposición o de eludirlo. Por eso no es contradictorio afirmar que en las sociedades del conocimiento hay un aumento de estabilidad y constancia paralelo al incremento de inseguridad y fragilidad.

Las dificultades que resisten a la concentración del saber tienen mucho que ver con la desaparición de un punto central autoritario de la sociedad. Utilizando una metáfora de Alain Touraine (1984), en la sociedad del conocimiento los actores no se relacionan con un punto central sino más bien con centros separados de decisión que forman un mosaico en lugar de una pirámide. Pese al discurso que denuncia la homogeneización, la sociedad actual ya no tiene unos pocos influyentes (o monolíticos) partidos políticos, estructuras familiares, sindicatos, comunidades religiosas, grupos étnicos, estratos sociales o clases. En cada una de esas formas de organización social se observa un proceso de descentramiento o relajamiento. Y la razón de ese proceso ha de buscarse en la naturaleza misma de ese saber que se ha constituido en el paradigma para entender la sociedad actual, en el tipo de poder que proporciona y en la debilidad que le es propia.

b. Poder y debilidad del conocimiento

Es ya un lugar común entre sus teóricos la afirmación de que en la sociedad del conocimiento la influencia colectiva, el ejercicio del poder y del dominio están mediatizados de manera creciente por el saber. El saber adopta cada vez más la función de los clásicos factores de producción, como la propiedad, el trabajo y la tierra. La aplicación de saber y no del tradicional aparato de poder se ha convertido en el medio de poder dominante y preferente de la acción social. Este cambio obliga a repensar la organización social examinando las características de un saber que tampoco es el mismo que el saber que tenían a la vista los sociólogos clásicos. Las teorías clásicas de la sociedad dependían excesivamente de una concepción más bien determinista de la evolución social y no habían reflexionado suficientemente sobre el poder y la impotencia del conocimiento científico.

El saber de las sociedades del conocimiento es un saber fundamentalmente disperso. La competencia que confiere el saber está tan diversificada y es tan sustituible y combinable que las distinciones sociales concretas en la sociedad del conocimiento son menos coherentes, unidimensionales y homogéneas que las de la sociedad industrial. El saber resulta cada vez más accesible, directa o indirectamente, a cada vez mayores sectores de la población.

La flexibilidad del saber se pone también de manifiesto en el hecho de que sus aplicaciones prácticas son menos evidentes, indiscutidas y explícitas que en las sociedades tradicionales. El saber está menos vinculado a estructuras sociales definitivas. Los cambios más recientes de la estructura social dependen de que la construcción social del saber se ha modificado. Me refiero a la importancia creciente de la (re)interpretación del saber y, en consecuencia, la pérdida de sus atributos típicos: seguro, fiable, definitivo, no controvertido, etc. La interpretación del saber y la reproducción del saber se han convertido en tareas sociales decisivas.

Por esa misma razón el progreso de la ciencia no significa que se facilite la planificación, la predicción y el control políticos. En determinadas circunstancias el progreso científico va unido a los desarrollos opuestos en la línea de una creciente fragilidad de la sociedad, a una mayor conciencia de los límites que acompañan necesariamente a todo saber. Los límites a los que me refiero son de carácter epistemológico; son límites puestos por el conocimiento científico mismo. La propia maquinaria de la ciencia —observaba Gehlen (1949, 12)— ejerce una coacción sobre el científico. No me parece acertado entender los límites del poder de la ciencia como una irracionalidad irreductible, como una carencia de ilustración de determinados grupos sociales o incluso como resultado de un empeño consciente de la ciencia para mantener a la población en la oscuridad con el fin de asegurar su propio poder. Lo más relevante para entender la sociedad en que vivimos sería descubrir las cualidades cognitivas y sociales que explican por qué el saber no científico tiene un nicho social significativo en las sociedades modernas.

Esta supuesta dinámica de sustitución de toda forma de racionalidad no científica fue cuestionada hace tiempo. Ya Durkheim no compartía la opinión de Comte de que las verdades científicas fueran a disolver radicalmente las expresiones mitológicas. En las verdades mitológicas se trata de expresiones que son aceptadas sin mayor comprobación, mientras que las científicas estarían sometidas a la verificación. Ahora bien, la acción social está continuamente bajo la presión del tiempo y no puede esperar a que los problemas sociales sean solucionados científicamente. Entre las condiciones de producción del saber científico está la suspensión de la escasez de tiempo y de la imperiosidad de actuar. El saber científico ha surgido generalmente bajo las condiciones de demora, distancia, examen y suspensión de las constricciones de la vida e incluso ha hecho de este retraimiento una característica esencial para la validez de esa forma de saber. Pero la vida no puede esperar (Durkheim [1912] 1994). La sociedad debe trabajar con determinadas concepciones acerca de ella misma. La inseguridad en la que trabaja la ciencia no es apropiada para la vida misma. Por decirlo con Pierre Bourdieu: se debe asignar a la praxis una lógica que plantee exigencias lógicas menos severas que la lógica de la lógica. La peculiaridad de la praxis consiste en que no permite una consideración teórica, pues la verdad de la praxis consiste en su ceguera respecto de su propia verdad (Bourdieu 1980). El hecho de que los sociólogos vayan siempre por detrás, el retraso del desarrollo científico permite a juicio de Durkheim la supervivencia de expresiones que podríamos llamar mitológicas. En las sociedades en que domina el conocimiento científico las verdades mitológicas no pierden su función social.

La idea de una marcha triunfante del saber científico y la consiguiente decadencia del saber tradicional supone al menos de modo implícito que, propiamente, sólo el saber científico progresa y que el saber no científico carece de toda dinámica progresiva. La impotencia del saber no científico encuentra su paralelo en la suposición de que la ciencia reduce continuamente el ámbito del saber tradicional, pero en absoluto lo acrecienta o incluso enriquece. Ahora bien, el saber científico remite a otras formas de saber, especialmente al saber común, al que no puede sustituir (Luckmann 1981). Y además, la ciencia misma es una fuente de crecimiento y de evolución del saber no científico (Brzezinski 1970). Mientras que nuestro conocimiento continúa incrementándose exponencialmente, nuestra ignorancia relevante lo hace incluso con mayor rapidez. Esta es la ignorancia generada por la ciencia (J. Ravetz 1987, 100). El progreso del conocimiento científico y sobre todo su aplicación práctica llevan consigo nuevos problemas irresueltos, efectos secundarios y riesgos. Desde este punto de vista, el discurso científico produce ignorancia, aunque sea certified ignorance.

La expansión del saber no está necesariamente acompañada por una reducción paralela del no saber y por un mejoramiento de la abarcabilidad. Al contrario, un crecimiento del saber puede muy bien suponer una explosión de confusión, inseguridad y una escasez de previsibilidad de la acción futura. La ciencia inaugura una pluralidad de posibilidades; pero con cada satisfacción, con cada conocimiento la ciencia produce una masa de nuevas preguntas, toda una nueva corriente de insatisfacción humana (Richta 1972, 249).

Entre las nuevas ignorancias una de las más evidentes es la que se sigue de la impredecibilidad de los movimientos iniciados. Muchos de los cambios que tienen su origen en causas científicas se sustraen paradójicamente del control racional, la planificación, la programación o la previsión. Consecuencias azarosas, no anticipadas, riesgos difícilmente reconocibles juegan ahora un papel más relevante que en las llamadas sociedades industriales. Me parece muy atinada la observación de Hermann Lübbe (1987, 95) sobre nuestra incapacidad colectiva de anticipar el futuro: la inexactitud de las predicciones ha aumentado en comparación con el saber del que disponemos. Todo presente anterior, en relación con el nuestro, disfrutó de la ventaja cultural extraordinaria de poder decir sobre su propio futuro cosas mucho más exactas que lo que podamos hacerlo nosotros. Lübbe se refiere fundamentalmente al saber técnico en sus observaciones acerca de la relación entre inseguridad y volumen del saber. La cantidad de las situaciones que modifican las condiciones estructurales de la vida aumenta proporcionalmente al volumen del saber disponible. La exactitud y la validez de los pronósticos no son mejoradas por el progreso del saber sino reducidas. La sociedad moderna es crecientemente frágil. Y esta tendencia se acentúa aunque —o precisamente porque— crece nuestro conocimiento de la naturaleza y de la sociedad. Se da la paradoja de que un aumento de nuestro saber pueda proporcionarnos un mejor conocimiento de sus límites. El saber no es nunca absoluto y deja de pretenderlo cuanto mayor es su alcance.

Una posible reserva ante este panorama de posibilidades liberadoras de la sociedad del conocimiento consiste en apelar a una tiranía de los expertos (Lieberman 1970) y a la consiguiente pérdida de las evidencias y derechos particulares. Hay quien sostiene que la técnica hace su propia política y que sus imperativos sirven a los intereses de la élite dominante (McDermott 1969). Esta advertencia merece ser analizada porque a menudo se apoya en una visión inexacta del significado social del crecimiento de las profesiones basadas en el saber. Esto no significa por ejemplo que la diferencia entre el conocimiento científico y el saber común sea cada vez mayor. Habermas sostiene que la racionalización empobrece progresivamente el mundo de la vida y aumenta la distancia entre la cultura de los expertos y el público. Pero este desarrollo no es inevitable. La necesidad de abandonarse de manera creciente a los expertos no tiene por qué ir necesariamente unida a un empobrecimiento de la vida cotidiana, de las formas y saberes que en ella se cultivan, ni a fortalecer la capacidad de manipular y controlar a los individuos. Más aún: la relativamente abierta facilidad de acceso a un asesoramiento especializado tiene consecuencias emancipatorias para el individuo.

La tradicional equiparación de saber y poder entendía el saber como algo que puede ser controlado privadamente y de este modo limitado su acceso. Y el poder político tradicional incluye la posibilidad de limitar las libertades individuales, de imponer la propia voluntad contra la resistencia de otros, de forzar la obediencia, de amenazar con la coacción y de perseguir administrativamente, sin excluir la posibilidad de la violencia física. No son estos el tipo de saber y de poder específicos de las sociedades del conocimiento. No se trata de que el poder pase a otras manos sino de que se modifican el modo y el contenido del poder y, por consiguiente, también los medios y su alcance.

Por otra parte, el dominio social adjudicado a la ciencia presupone un grado de coherencia y una unidad de intereses que no se observa entre los expertos técnicos y en los discursos que remiten a la autoridad de la ciencia. Hay una imagen extendida de la ciencia como un edificio cimentado sobre el consenso que no se compadece bien con el hecho de que es más bien una comunidad en la que las disputas acerca de las estrategias de investigación y la interpretación de los resultados de la investigación son bastante virulentas. Los expertos no actúan como una unidad, el saber especializado no es unitario ni parece que en el futuro vaya a haber un consenso definitivo entre los expertos. Más bien ocurre que el descubrimiento del poder y la simultánea fragilidad del conocimiento científico lleva a debilitar la autoridad de los expertos y al escepticismo frente a la idea de que la opinión de un experto sea imparcial y objetiva. La experiencia enseña que las controversias técnicas tienen la forma de una competición entre interpretaciones de una situación (Barnes 1985, 106). Nada más alejado de la realidad que una élite conspirativa rendida pacíficamente ante la objetividad de sus procedimientos y aglutinada por un mismo objetivo común contra los inexpertos.

Es muy cuestionable la tesis de una nueva clase, de nuevas formas de oposición entre clases, para los nuevos conflictos políticos y económicos (Galbraith 1967; Larson 1984). Esto equivaldría a suponer que los expertos pueden desarrollar una suficiente coherencia de intereses, organización y solidaridad política, lo cual no sería tampoco suficiente para formar una clase. No parece oportuno el uso del concepto tradicional de clase cuando la extensión de la ciencia en las actuales relaciones sociales lleva consigo una peculiar fragilidad de la estructura social que se muestra como un obstáculo para la formación de monopolios. Contra esta ficción puede establecerse con alguna seguridad que los grupos profesionales no han tomado el mando de la sociedad del conocimiento. Y esto no es tanto el resultado de la modestia de los expertos o su aversión al poder, sino que depende simplemente de los asuntos que tramitan. La movilización y aplicación de esas especialidades disminuyen paradójicamente —y seguro que de manera no intencionada— la verosimilitud de que ese grupo de expertos asuma una posición social dominante. En la medida en que el saber es capacidad de acción, de hacer algo o de poner algo en marcha, los clientes de los expertos pierden siempre un cierto grado de su dependencia, aunque sólo sea porque pueden poner en cuestión el saber que se les ha puesto a disposición.

Otra de las críticas que se viene abajo al analizar las sociedades del conocimiento es la que denuncia una homogeneización general. Hay una pluralidad de identidades locales, regionales o nacionales que hacen frente con éxito al proceso mundial de homogeneización por los mismos motivos que señalaba anteriormente para poner en duda la sustitución de todas las formas de saber por el conocimiento científico. Pero lo que hace más improbable esta igualación universal es la naturaleza misma del conocimiento que gestionan y tramitan nuestras sociedades: su carácter interpretativo y contextual, la diversidad de sus posibilidades de aplicación, su disponibilidad flexible. Como subraya Ralf Dahrendorf (1980, 753), los límites de la homogeneización tienen que ver con el hecho de que, toda cultura ha integrado los símbolos de la modernidad en su propia tradición; cada una hace de esos símbolos parte de su vida y sólo de ella. Con otras palabras, sería falso pensar, como lo hace la concepción extrema de la homogeneización, los contextos sociales locales como en situaciones exclusivamente pasivas frente a las influencias exteriores. Las situaciones locales no solamente ofrecen resistencia sino que tienen recursos para “asimilar” activamente prácticas culturales importadas. Las prácticas y los productos culturales no determinan de una vez para siempre soberanamente su modo de uso y aplicación al margen de los contextos de aplicación.

Nos hemos acostumbrado a considerar el saber como un instrumento para consolidar las relaciones de poder existentes, como si el progreso de la ciencia jugara siempre en favor de los más poderosos, pudiera ser fácilmente monopolizado por ellos y eliminara con éxito las formas tradicionales de saber. Pienso que esta idea de la ciencia como un instrumento eminentemente represivo y favorecedor de los poderosos es inexacta. Por eso cabe decir que en la nueva Alejandría global de la información computerizada no hay una seguridad perceptiva última, ninguna validación última de un texto remite a un original escrito o a una autoridad original. Es una cultura basada en una noción del conocimiento incesantemente interpretativo (A. Smith 1986, 162). El saber es un potencial liberador para muchos individuos y grupos. Precisamente las dificultades y los espacios de interpretación que acompañan al saber son lo que abren una serie de oportunidades de influencia y actuación frente a los expertos y al saber autoritario (Smith/Wynne 1989). La mera necesidad de que el saber deba ser siempre re-producido y que los actores deban apropiárselo, proporciona la posibilidad —por así decirlo— de estampar en el saber una marca personal. El proceso de apropiación deja algunas huellas. En el curso de esta actividad de apropiación, los agentes se hacen con nuevas capacidades cognoscitivas, profundizan en las que ya poseen y mejoran en general la eficacia de su trato con el saber, lo que a su vez les permite también desenvolverse con mayor capacidad crítica frente a las nuevas ofertas de saber y descubrir posibilidades de acción inéditas. La distribución social del saber no tiene las propiedades de un juego de suma cero.

c. La estructura de las sociedades del conocimiento

Nuestra concepción de la estructura social está todavía hoy fuertemente vinculada a la teoría de la sociedad industrial. En esta sociedad las jerarquías sociales se construyen y legitiman por relación al proceso de producción y las consecuencias de su organización específica. De manera muy similar, casi todos los teóricos de la sociedad postindustrial partían del supuesto de que la realidad social, económica y cultural estaría determinada por la racionalización y la planificación, y que los instrumentos de ese vigilancia estarían concentrados en manos de los organismos estatales. Esta tesis implicaba que habría de ser más fácil controlar administrativamente los comportamientos individuales, subsumir en protocolos administrativos cualquier movimiento social.

Ahora bien, en la medida en que el trabajo es llevado a cabo crecientemente por profesiones del saber, que pertenecen a los grupos políticamente más activos de una sociedad, tiene que modificarse necesariamente la configuración del sistema político. Habrán de cambiar especialmente las posibilidades de reproducir las tradicionales relaciones de dependencia. En la sociedad del conocimiento, las posibilidades de acción de los individuos y los pequeños grupos de personas se han ampliado considerablemente, aunque no debe suponerse que esta ampliación de la capacidad operativa valga para todos los niveles de acción y para todos los actores. Pero, en términos generales, estos cambios conducen a una autoridad estatal más superficial y volátil. Al menos en este sentido se puede concluir que el crecimiento del saber y su progresiva expansión social crean mayor inseguridad y contingencia; no son la base para un dominio más eficiente de instituciones sociales centrales.

En las sociedades del conocimiento la fragilidad de las estructuras sociales aumenta considerablemente. La capacidad de la sociedad de actuar sobre ella misma es incomparablemente elevada. Pero las sociedades del conocimiento son políticamente frágiles no porque sean democracias liberales —como muchos conservadores quisieran sostener— sino porque son sociedades del conocimiento. Las sociedades del conocimiento incrementan el carácter democrático de las democracias liberales. En la medida en que crecen las oportunidades de muchos para participar efectivamente disminuye la capacidad del estado para imponer su voluntad. La “resistencia” de las circunstancias se ha vuelto mucho más significativa y el ejercicio del poder está más equilibrado que en las antiguas sociedades industriales. El extendido poder de disposición sobre el saber reflexivo reduce la capacidad de las instancias tradicionales de control para exigir e imponer disciplina y conformidad. Las posibilidades de ejercer una presión contraria han aumentado de manera más que proporcional.

El conocimiento científico abre unas posibilidades de actuación que continuamente se amplían y modifican. En contraposición a la imagen ortodoxa de las sociedades modernas, se hace necesario insistir en la capacidad de acción conquistada para los agentes sociales, en la flexibilidad, heterogeneidad y volatilidad de las estructuras sociales, en la posibilidad de que un mayor número de individuos o grupos puedan influir y reproducir según su criterio esas estructuras. También se ha fortalecido la capacidad del individuo de actuar en su propio interés. La ciencia se convierte en un componente de la política porque el modo científico de comprender la realidad es utilizado para definir el interés que los actores políticos articulan y defienden (Haas 1990, 11). La explicación y la imposición de intereses políticos se basa en buena parte en concepciones de la sociedad tal como son articuladas en la ciencia. Pero no debe olvidarse que la política apoyada en un saber científico también puede ser una política de oposición y resistencia. Debido a que el discurso científico moderno no tiene unas propiedades monolíticas, se convierte en un recurso de acción política para individuos, grupos y organizaciones que persiguen intereses y fines muy diversos. La ciencia no es sólo un instrumento armonizador, que aparca conflictos y modera las tensiones. El saber aumenta la capacidad de acción de todos, no únicamente de los poderosos.

En la mayor parte de los análisis de los críticos sociales se da por hecho que la sociedad moderna es una unidad de civilización que tiende a la homogeneización de todos los ámbitos de la vida y las formas de expresión. Muchas observaciones de este estilo contienen un crudo determinismo precisamente porque no aciertan a entender que el tipo de saber que configura las sociedades del conocimiento no es el saber disciplinado y exacto de las ciencias positivas sino otro más flexible y frágil desde el que no resulta fácil establecer una organización social rígida.

Así pues, el proceso de modernización debe ser entendido de una manera menos rígida y unívoca. Incluso los conceptos de diferenciación funcional y racionalización de la realidad social que eran considerados como el motor de las sociedades modernas deben ceder el paso a versiones más abiertas de la evolución social. Por ejemplo, el principio de fragmentación de la sociedad, en virtud del cual ésta pierde su centro y se configura en una serie de subsistemas autónomos, debe ser corregido para registrar también movimientos de sentido contrario. Concepciones de la sociedad menos deterministas hablan ya de procesos de integración y des-diferenciación (Tilly 1984, 48) que pueden a su vez modificar la tendencia dominante de las sociedades modernas en la línea de una mayor variabilidad, fragilidad y contingencia de los nexos sociales. La idea de una única tendencia evolutiva es por consiguiente muy cuestionable. Es significativo que muchos límites no cumplan su función de barrera, que haya posibilidades inéditas de tránsito entre fronteras supuestamente impermeables. El proceso de modernización no ha de entenderse como el decurso de estadios evolutivos estrictamente predeterminados sino como un proceso abierto, a menudo incluso reversible, de expansión de la acción social. La modernización sería entonces un proceso múltiple y no lineal de extensión de las posibilidades operativas.

El aumento del control social del saber es uno de esos fenómenos que contribuye a modificar el estatuto que al saber se le asigna en las críticas a la civilización tecnológica y científica. La misma existencia de este control es un indicativo de cómo la esfera del saber no se ha autonomizado absolutamente y es susceptible de control desde otros ámbitos sociales como el derecho o la política.

En un principio, la ciencia y la técnica pueden ser fácilmente puestas al servicio de cualquier decisión. El carácter exotérico, inaccesible a muchos, de la ciencia convierte al sistema científico en un recurso para simbolizar independencia y objetividad. Por eso la ciencia se ha erigido frecuentemente en una autoridad de la que puede disponerse para las decisiones controvertidas. Pero una cierta desconfianza ha acompañado siempre al desarrollo de la ciencia y la técnica, sin que parezca que en el futuro vaya a ser de otra manera. Se da una coincidencia curiosa en la sociedad contemporánea: junto a una pérdida de temor y respeto frente a la autoridad y las disposiciones de la administración estatal hay que registrar también una preocupación creciente por los efectos negativos del progreso técnico y científico. Los problemas de medio ambiente, las consecuencias del uso de determinados artefactos técnicos, la percepción de que no todos los problemas sociales pueden ser controlados racionalmente ni evitados o resueltos mediante la planificación son indicativos de que la ciencia y la técnica ya no gozan de la confianza general e incuestionada. Es como si la disminución del miedo se viera compensado por un aumento de las preocupaciones.

Mientras tanto el control social del conocimiento científico y del saber técnico ha aumentado considerablemente. En todos los países desarrollados existen complejas prescripciones y un gran número de organizaciones que se ocupan de registrar, permitir, verificar y supervisar ya sea productos farmacéuticos, el uso de tecnologías de alto riesgo, los modos de investigación, las patentes o el control de los alimentos. Ya no nos encontramos en la época de una esfera científica completamente autónoma y celosa de cualquier intervención exterior. La aplicación del conocimiento científico conduce a que el saber se convierta en parte de un contexto social externo, no científico. Una consecuencia de esta incorporación del conocimiento científico en un contexto exterior al sistema de la ciencia es que los mecanismos de control allí existentes influyen en el saber. El saber no se puede librar de los procesos de selectividad de esos contextos. Por eso actualmente la supervisión política del conocimiento ya no es lamentada como una ruptura intolerable de las normas científicas. En la medida en que el saber se convierte en un componente constitutivo de las sociedades, la producción, reproducción, distribución y realización del saber no puede sustraerse a la discusión política explícita y las disposiciones jurídicas. La producción y distribución del saber se han convertido en cuestiones habituales de la política y en objeto de decisiones económicas.

Con la sociedad del conocimiento estamos en una situación en la que ya no ocurre que unos pocos actores controlan casi todo, sino más bien que muchos controlan más bien poco. Ese saber es más disponible para todos, por lo que se reduce la capacidad de las instancias tradicionales de control para imponer su disciplina. Las capacidades de influir, ejercer resistencia y hacerse valer han aumentado de manera más que proporcional en el individuo y en los diversos grupos que configuran la sociedad civil. Al descubrir estas posibilidades se abren también nuevas formas de ejercer la libertad y pierde fuerza la pesadilla de una sutil manipulación. Con el progreso de la ciencia ha de disminuir la fe en ella: el asombro dura poco, lo que tarda en desvanecerse el fantasma que pensamos habita en la máquina hasta que conocemos su funcionamiento. Saber es saber lo precario que es el saber, lo disperso que está, su fácil acceso, su vulnerabilidad a la crítica, su debilidad para combatir la tozudez del sentido común y las costumbres inveteradas, en suma: que la vida es poco gobernable y que la última garantía de la libertad personal es la pereza de las cosas a ser manejadas.

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Fonte: Daniel Innerarity
www.raison-publique.fr – 29 jun 2010

Vírus divinos ~ por Hélio Schwartsman

A cross

Na semana passada a Itália entrou com um recurso no Tribunal Europeu de Direitos Humanos para que esta corte reveja sua decisão de novembro passado de mandar retirar os crucifixos de todas as salas de aula de escolas públicas. Como o acórdão tem grandes chances de virar jurisprudência para toda a Europa, dez outros países (a maioria católicos e ortodoxos) manifestaram apoio a Roma.

Com o arrefecimento do comunismo, o embate ideológico se deslocou da economia para temas culturais. Frequentemente, questões de pouca ou nenhuma consequência prática provocam debates acalorados. A controvérsia em torno de crucifixos em tribunais e escolas é um caso paradigmático.

Para os novos iconoclastas, espaços públicos não devem ostentar nenhuma espécie de adorno religioso, sob pena de violar o princípio da laicidade do Estado, em maior ou menor grau consagrado nos países democráticos contemporâneos.

O raciocínio central é o de que membros de religiões não cristãs –e vale lembrar que mesmo algumas denominações protestantes denunciam o crucifixo como idolatria–, agnósticos e ateus podem sentir-se constrangidos com a exibição ostensiva de cruzes em espaços tão caracteristicamente republicanos nos quais sua presença é exigida por lei. Ninguém, afinal, pode alegar divergências religiosas para ausentar-se da escola ou de prestar um testemunho.

Já os tradicionalistas contra-atacam dizendo que a exposição dos crucifixos faz parte da identidade nacional de muitos países europeus e não corresponde em absoluto a uma tentativa de conversão. Ignorar o papel que o catolicismo desempenhou na formação da Itália, por exemplo, constituiria uma falsificação da história.

No mais, vários países têm cruzes incorporadas a suas bandeiras e possuem hinos nacionais que evocam Deus. Não cabe à Justiça, mas aos Parlamentos, e apenas se acharem que é o caso, modificá-los. Católicos pragmáticos sugeriram a realização de um plebiscito na Itália para decidir o futuro dos crucifixos. Escoram-se em pesquisas que apontam que 60% da população quer manter o Cristo agonizante nas salas de aula de seus filhos.

Ambos os argumentos encerram algumas verdades, mas também apresentam uma série de limites. Para começar, o princípio do laicismo nos espaços públicos é menos absoluto do que apregoam seus entusiastas. Nem mesmo a França, que sempre esteve na vanguarda do anticlericalismo, cogita de desfazer o Louvre (um museu estatal) das peças que de algum modo se relacionam com uma religião –o que deve corresponder a uns 90% do acervo. Qual juiz teria a coragem de mandar a Vênus de Milo a hasta pública para manter a “neutralidade” de um Estado que não pode sancionar os deuses pagãos?

Também não é muito exato afirmar que o crucifixo possui significações que transcendem a religião. Em termos objetivos a cruz é um método de execução bastante popular entre os séculos 6 a.C. e 4 d.C. Era utilizada por romanos, persas e egípcios.

Se alguém ousasse propor que as paredes de nossos tribunais fossem enfeitadas por forcas ou cadeiras elétricas provocaria indignados e justos protestos. Não é preciso recorrer a manuais de estética para constatar o mau gosto de uma iniciativa como essa. Se nós deixamos de ver a cruz como um instrumento de tortura, é apenas e justamente porque ela se tornou o símbolo maior do cristianismo, caráter que lhe é indissociável.

Acho importante destacar mais uma vez a desimportância dessa discussão. Para falar um português bem claro, tudo não passa de uma tremenda de uma bobagem. Eu, que sou ateu de carteirinha, jamais me senti constrangido por ter de entrar numa sala que dependure os pedaços de pau entrelaçados. Na verdade, não conheço ninguém que fique, mas admito, é claro, essa possibilidade.

Também a reação dos religiosos me parece despropositada. Se a Corte mantiver sua posição de que as cruzes ferem os direitos das minorias não cristãs e mandar retirá-las das escolas e tribunais, isso em nada diminuirá o papel da religião para os fiéis. É preciso muita paranoia para ver aí uma golpe contra Deus, o qual, de resto, se tem apenas uma fração poderes que os crentes lhe atribuem, seria plenamente capaz de defender-se sozinho.

A insistência na manutenção me remete a um livro que acabo de ler. Trata-se de “The God Virus”, de Darrel Rey, psicólogo e estudioso das religiões, que percorreu uma trajetória suave até o ateísmo. Criado num ambiente fundamentalista, ele se tornou mestre em estudos religiosos por um seminário metodista. Foi aos poucos se afastando da igreja. Com 30 anos, havia se tornado agnóstico e, aos 40, já era ateu.

“The God Virus” não é uma obra excepcional, mas traz alguns “insights” interessantes. A estrutura é até bem simples. Rey abraça a tese de Richard Dawkins de que existem complexos de unidades culturais (os memes) que são capazes de reproduzir-se, mutar, evoluir e morrer exatamente como seres vivos e a aplica à religião, com especial cuidado com as relações interpessoais sob a batuta divina.

Num resumo grosseiro, como diz o título, o autor equipara deuses a vírus. E é o próprio Rey quem lembra que nem todos os vírus são patológicos. Nós podemos viver relativamente bem com vários deles, embora existam alguns tipos extremamente parasitários.

Há vários pontos do livro que seria interessante destacar, mas me limito ao papel dos vetores. Religiões precisam de um veículo para infectar as mentes dos humanos que reproduzem e executam suas ideias. E eles existem aos borbotões. São os próprios pais que introduzem seus filhos nos mistérios de sua crença. Os mais eficientes desses vetores, entretanto, são os sacerdotes, pastores, padres, rabinos imãs etc. Eles, mais do que os fiéis ordinários, se dedicam a converter pessoas e preservar a “pureza” do DNA religioso, para que não seja conspurcado por mutações que possam descaracterizá-la.

Vale lembrar que isso já ocorreu. O cristianismo, por exemplo, se apropriou de genes de outros credos e teve tanto sucesso que acabou por matar muitas das fés das quais emprestou elementos. Um exemplo simples é o mitraísmo, do qual foi retirado o mito do nascimento virginal. O culto a Mitra, que era tão popular entre os legionários romanos, pereceu esmagado pela conversão do império àquela forma exótica e não tribal de judaísmo que ficou conhecida como cristianismo.

Uma observação curiosa (e de alto poder explicativo) do autor diz respeito aos escândalos de abusos sexuais por padres católicos. Vetores exigem um alto investimento do vírus para ser criados. Eles precisam ser treinados, o que exige tempo e consome recursos. Uma vez formados, devem ser mantidos e protegidos, exceto em algumas poucas situações em que o vetor se torna mais poderoso morto do que vivo, hipótese em que os chamamos de santos e mártires.

De um modo geral, porém, vetores são mais valiosos do que fiéis comuns. E isso explica o fato de a igreja não ter pensado duas vezes antes de criar toda uma rede de proteção e acobertamento para os padres que abusavam da garotada, ainda que, nominalmente, a religião exista para garantir a salvação do praticante.

E é justamente aí que reside o que, a meu ver, é o ponto central da obra de Rey. As religiões, como prevê o modelo dos memes, existem apenas para manter vivo, ativo e tão puro quanto possível o DNA de seu Deus. Todo o resto é adorno. E cada milímetro de espaço religioso (no qual o vírus possa reproduzir-se) vale a pena. Daí a insistência na manutenção dos crucifixos.

E, já que voltamos a esses aparelhos de tortura que tanto mobilizam as almas das pessoas, creio que precisamos buscar a solução para o problema fora da lógica da propagação viral. Diante da aporia entre religiosos e secularistas, deveria prevalecer a regra da boa educação: se nem todos que estão obrigados a comparecer às escolas públicas e aos tribunais são cristãos, é impolido impor-lhes essa imagem. Paredes nuas não são, afinal, tão feias assim.

Fonte: Folha SP, 08 jul 10

O silêncio da miséria, onde vagam os vassalos do feudalismo nordestino ~ por Arnaldo Jabor

Você já viajou pelo interior de Alagoas? Há alguns meses eu fui de carro até uma cidade a apenas uma hora e meia de Maceió. Parecia um deserto vermelho de barro, pontilhado de miseráveis vilarejos de uma só rua.

O motorista dizia: “isso aqui é tudo de Renan, isso aqui de Lira, isso aqui de fulano, sicrano”. Eu olhava e só via vazios com algumas almas penadas nas estradas. “E isso aqui é do MST.”

Andamos meia hora sem ver casas, nem plantações, além de algumas usinas desativadas. Era o silêncio da miséria, a paz do nada, onde vagam os vassalos do feudalismo nordestino. Aqueles municípios paralíticos já são catástrofes secas, só que silenciosas, paradas no tempo.

De repente, esta tragédia fixa, quase invisível, se transformou em uma tragédia bruta e retumbante. Ai, o verdadeiro Brasil apareceu diante de nós: abandonado, sem verbas, só usadas por interesses políticos do governo.

Só nos restou a solidariedade, mas como sentir a dor de um pobre homem catando comida na lama para dar ao filho chorando no colo? Dizendo o que? “Aí que horror?”

A solidariedade tinha de vir antes para proteger aqueles brasileiros raquíticos, famintos, analfabetos, que só são procurados pelos donos do nordeste para votos ou para serem “laranjas” em roubalheiras das oligarquias.

Fonte: Globo, 30/06/10 por Arnaldo Jabor

No tener acceso a Internet genera más angustia que la privación de sexo

Cuatro de cada diez españoles (el 42%) reconocen que la situación que más angustia les provoca es saber que no podrán conectarse a Internet durante una semana; mientras que sólo el 37% reconoce que lo que más ansiedad les provoca es no mantener relaciones sexuales.

Y es que, según un estudio realizado por conZumo en base a más de 600 respuestas de internautas, Internet se ha convertido en algo tan fundamental en la vida de los españoles que estos lo sitúan incluso por delante del sexo en su orden de prioridades.

El 75% de los encuestados ha confesado que navegar por la red les ha hecho perder tiempo de sueño

Así las cosas, el 42% de los hombres y mujeres – no se revelaron diferencias entre sexos – afirma que lo que les provoca más angustia es saber que no podrán acceder a Internet durante una semana, una situación seguida de cerca por la privación de relaciones sexuales durante el mismo periodo, algo que es lo que más angustia al 34% de mujeres y al 42% de los hombres.

El móvil tampoco se queda atrás en esta comparativa y dos de cada diez españoles (24% de mujeres y 16% de hombres)declaran que no poder emplearlo en una semana les provocaría ansiedad.

Las horas de sueño también se ven alteradas por el uso de Internet. Así, el 75% de los encuestados ha confesado que navegar por la red les ha hecho perder tiempo de sueño, mientras que sólo el 13% han respondido que el culpable es el teléfono móvil. El sexo, por su parte, quita el sueño al 30%, muy por debajo de lo que consigue Internet.

Pero, ¿y si ponen a los españoles en el aprieto de elegir entre un ordenador con acceso a Internet, un teléfono móvil o su pareja para pasar un mes recluido en una celda? Ante esta situación la pareja sale ganando con un 57%, si bien Internet no obtiene malos resultados ya que un 39% de los españoles lo prefiere a estar con su pareja. El teléfono móvil, por su parte, es el gran olvidado ante una situación así, puesto que sólo un 4% elegiría un móvil de última generación.

En cuanto al tiempo máximo sin practicar estas actividades, el teléfono móvil se convierte en algo imprescindible, ya que el 70% de los encuestados no han pasado más de un día sin usarlo. Le sigue Internet con un 51% y tan sólo un 18% respondieron que practican sexo todos los días.

Fonte: EUROPA PRESS 27 mayo 2010

O sexo triste dos jovens ~ Lya Luft

Abstract seventies star design that is ideal a...

“A nós, adultos, cabe não desviar os olhos, mas trabalhar na esperança de que um dia nossos adolescentes conheçam o sexo com ternura”

Procuro ser aberta ao novo, ao que me agrada no novo e também ao que exige um certo tempo para ser assimilado. Às vezes há o que não vale a pena ser assimilado, então, vou buscar outras paisagens. Eventualmente não sabemos se vale ou não, então, a gente fica humilde e espera.

Uma novidade (para mim) espantosa, narrada e confirmada em mais de um lugar no país, é dessas que não quero assimilar. Se possível, enterrava numa cova funda, varrida para baixo de mil tapetes, fazia de conta que não existia: o sexo (ou simulacro de sexo) sem encanto, sem afeto, sem tesão, o sexo triste ao qual são coagidos pré-adolescentes, quase crianças, em famílias de classe média e alta. Essas que pensamos estar menos expostas às crueldades da vida.

Talvez eles não precisem comer lixo, correr das balas dos bandidos, suportar brutalidades e incestos, tanto quanto os mais desvalidos. Seu mal vem sob outro pretexto: o de ser moderno e livre, ser aceito numa tribo, causar admiração ou inveja. Cresce, que eu saiba, o número de meninas de 12 a 14 anos grávidas.

O impensável ocorre muitas vezes em festinhas nas quais se servem bebidas alcoólicas (que elas tomam, ou pagariam mico diante das amigas, e com essa desculpa convencem os pais confusos), não há nenhum adulto por perto (seria outro mico, e assim elas chantageiam os pais omissos), e ninguém imaginaria o que ia rolar.

Nessas ocasiões pode rolar coisa assombrosa sob o signo da falta de informação, autoridade e ação paternas. Nem sempre, mas acontece. Crianças bêbadas no chão do banheiro de clubes chiques, adultos cuidando para não sujar o sapato no vômito não são novidade (ambulância na porta, porque algumas dessas meninas ou meninos passam mal de verdade); quantas meninas consigo beijar na boca numa festinha dessas? Em quantos meninos consigo fazer sexo oral?

Sexo que vai congelando as emoções ou traz uma doença venérea, quem sabe uma absurda gravidez – interrompida num aborto, de sérias consequências nessa idade, ou mantida numa criança que vai parir outra criança.

“Roubaram a sexualidade desses meninos”, me diz uma experiente terapeuta. Não deixaram tesão nem emoção, mas uma espécie de agoniado espanto, nessas criaturas inexperientes que descobrem seu corpo da pior maneira, ou aprendem a ignorá-lo, estimuladas ou coagidas por incredulidade ou fragilidade familiar, pelo bombardeio de temas escatológicos que nos assola na TV e na internet, com cenas grotescas, gracejos grosseiros em torno do assunto – “valores” e “pudor”, palavras hoje tão arcaicas.

Efeito da pressão de uma sociedade imbecilizada pela ordem geral de que ser moderno é liberar-se cada vez mais, sem saber que dessa forma mais nos aprisionamos. Precisamos estar na crista da onda em tudo, tão longe ainda da nossa vida adulta: sendo as mais gostosas e os mais espertos, desprezando os professores e iludindo os pais, sendo melancolicamente precoces em algumas coisas e tão infantilizados e ignorantes em outras, nisso incluindo nosso próprio corpo, emoções, saúde e vitalidade.

A nós, adultos, cabe não desviar os olhos, mas trabalhar na esperança (caso a tenhamos) de que nossos adolescentezinhos, às vezes ainda crianças, vivam de maneira natural essa delicada fase, e um dia conheçam o sexo com ternura, na tensão de sua idade – forte e boa, imprevista e imprevisível, com seu grão de medo e perigo, beleza e segredo.

Que essas criaturinhas sejam mais informadas e mais conscientes do que, muito mais protegidas que elas, nós éramos. Mas seguras e saudáveis, não precisando lesar sua bela e complexa intimidade com tamanha violência mascarada de liberdade ou brincadeira. Sobretudo, sem serem estimuladas a lidar de modo tão insensato com algo que pode lhes causar traumas profundos, ou anular um aspecto muito rico de sua vida.

É difícil, mas a gente precisaria inventar um movimento consciente, cuidadoso, responsável, contra essa onda sombria que quer transformar nossas crianças em duendes pornográficos, deixando feias cicatrizes, e fechando-lhes boa parte do caminho do crescimento e do aprendizado amoroso.

Fonte: Revista Veja, 23 maio 2010

Democracia e educação ~ por JB Libanio

No final da década passada, The Economist encheu os olhos da vaidade brasileira, ao anunciar que o país na atual década se tornaria a quinta potência mundial e a terceira em 2050. O peso da fama da revista tornou a ilusão ainda maior. Por que ouso falar de ilusão? Porque em uma década ou em várias décadas não se constrói uma grande potência sem educação.

Não precisamos povoar essa afirmação com multidão de números estatísticos. Esses, não raro, enganam-nos com a aparente neutralidade. A educação de um povo constata-se a olhos vistos. Basta não ser cego. Existem, sem dúvida, alguns grupos de elite. Mas o povo se alimenta da cultura de massa e esta se constrói, sobretudo, por obra dos meios de comunicação social. Aqui sofremos enormemente.

Enquanto a sociedade civil e o Estado não se unirem, em força única, para exigir dos programas de TV maior nível cultural, que irradiem valores consistentes em vez de terrível vulgaridade e banalidade, não há futuro para o Brasil. Haja vista os noticiários que gastam a maior parte do tempo em divulgar violências ou eventos triviais. Um tarado que assassina jovens depois de violentá-las interessa mais que todas as campanhas de solidariedade do mundo. A imagem que brota do ser humano das manchetes televisivas e de jornais favorece mais a desvalorização da vida que o respeito e a esperança no ser humano.

Os clássicos latinos tinham entendido que os relatos históricos cumpriam a função pedagógica de transmitir exemplos a serem imitados. Nesse sentido, Cícero dizia que a história é a “mestra da vida” e os historiadores se detinham em contar a vida de “varões ilustres” e modelares. Em linguagem de hoje, o clássico romano diria que a TV e a grande imprensa existem para transmitir os valores éticos fundamentais para a convivência humana. Que decepção se se detivessem em frequentar a maioria dos programas que ressudam imediatismo, exterioridades, futilidades, intimidades expostas ao grande público!

A democracia se define pelo bem comum, pelo conviver entre as pessoas em vista da realização do “ser humano todo e de todo ser humano”. Imperam, no entanto, o individualismo, a lei da selva, a privatização do público e a publicização do privado. A confusão das duas esferas humanas mina a democracia. A cultura pós-moderna individualista tende a privatizar a esfera pública. A corrupção nos meios políticos do país não passa de um apoderar-se de bens públicos. E por outro lado, intimidades sexuais e afetivas são lançadas por revistas e programas por todos os ares.

A educação ensina o respeito ao público e o cuidado e recato com o privado. Quando ela falha, misturam-se os campos com detrimento para ambos. A vida social torna-se a maior vítima dessa falta de educação. Perde-se a noção de viver em comunidade. Inverte-se o processo educativo que consiste na humanização continuada das pessoas para crescente animalização. Adeus democracia! Adeus potência mundial!

www.jblibanio.com.br

JB Libanio é Padre jesuíta, escritor e teólogo. Ensina na Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia (FAJE), em Belo Horizonte, e é vice-pároco em Vespasiano

Fonte: Adital, 7 maio 2010

Para especialista, ‘melhor democracia não significa melhor sociedade’

Especialista em estudos sobre o tema, o cientista político Marc Plattner afirma em entrevista que “a melhor democracia não significa necessariamente a melhor sociedade”.

“A democracia é uma forma de governo, o que significa que as pessoas têm o poder de tomar as decisões. Mas isso não quer dizer que sejam as melhores decisões”, afirma Plattner, cofundador da revista acadêmica Journal of Democracy.

Editor de diversos livros sobre o tema, especializado em democracias emergentes, como a Índia e os países latino-americanos, Plattner ainda assim defende o modelo liberal de democracia porque, mais que o governo da maioria, representa a proteção dos direitos e liberdades dos indivíduos que compõem a sociedade.

“Os últimos 25 anos do século passado foram muitos bons para o avanço da democracia”, afirma. “Hoje estamos em um período de estagnação em termos de progresso democrático, mas não percebemos uma reversão completa da democracia ou autocracia.”

A entrevista é parte da minissérie de sete reportagens sobre democracia que a BBC Brasil propõe neste ano de eleições. Através de entrevistas com especialistas, a série avaliará o estágio democrático de seis casos simbólicos: Brasil, Grã-Bretanha, Estados Unidos, Índia, Rússia e Irã.

A seguir, leia trechos da conversa da BBC Brasil, na qual Plattner diz não acreditar em um “modelo russo ou iraniano” de democracia e avalia que o Brasil já deixou de ser “emergente” neste aspecto.

Qual sua definição de democracia?

No dicionário, democracia significa o governo do povo. No sentido atual, porém, significa democracia liberal, que não é apenas o governo da maioria, mas a proteção dos direitos e liberdades dos indivíduos que compõem a sociedade. Esses dois aspectos têm de estar presente.

Existe algum modelo de democracia que se aproxime do ideal no mundo de hoje?

A melhor democracia não significa necessariamente a melhor sociedade. A democracia é uma forma de governo, o que significa que as pessoas têm o poder de tomar as decisões. Mas isso não quer dizer que sejam as melhores decisões. Quando se discute esse tema, os países nórdicos – Suécia, Dinamarca, Noruega, Finlândia – tendem a sair na frente, porque eles têm menos corrupção e relativamente menos desigualdades econômicas que outros países. Mas não sei se isso quer dizer que sejam mais democráticos que outros, e sim que suas sociedades têm mais virtudes que outras.

O escritor americano Fareed Zakaria sugeriu que o processo de democratização mundial gerou democracias de fachadas, ou “iliberais”. O senhor acha que essa é uma tendência?

O diagnóstico de Zakaria é correto. Antes de 1975, a democracia se restringia aos países ricos e avançados do Ocidente, que também tinham uma longa história de liberalismo. Nos anos 1970 ocorre a chamada “terceira onde da democratização”. Dezenas e dezenas de países que não tinham histórico de liberalismo, tradição de Estado de Direito e não eram economias avançadas começam a ter eleições e escolher seus próprios líderes. Não surpreende, portanto, que muitos fossem iliberais no início. A questão é como você desenvolve a democracia liberal. Para mim, o caminho passa por trabalhar junto com essas democracias iliberais, tentando fortalecer o Estado de Direito, a proteção dos direitos dos indivíduos, etc.

Zakaria chegou a sugeriu que, em vez de incentivar o nascimento de “democracias iliberais”, era melhor criar as “autocracias liberais”. Qual sua opinião?

Discordo de Zakaria. Se você analisar o mundo hoje, não existem autocracias liberais, no sentido de que os países que são autocráticos tampouco tendem a ser liberais e você não pode contar que seu direito seja respeitado nesses países.

É possível falar de um modelo de democracia iraniano ou russo, ou nesses países simplesmente não há democracia?

Esses países não são democracias e certamente não democracias liberais. Você pode jogar com as palavras e falar de “democracia gerenciada” ou “democracia soberana”, como o governo Putin tem feito. Da mesma forma, na era soviética, falava-se de “democracia popular”. Você pode usar e abusar da palavra sem chegar à verdade. A maioria dos estudiosos sobre a democracia concorda que nem o Irã nem a Rússia são democracias.

Então o senhor não acredita que haja fatores culturais, por exemplo? Podemos apontar para a história autoritária da Rússia, que explicaria o formato do sistema político do país.

Sim, há fatores históricos que dificultam a democratização dos países. Mas eles se tornam democráticos. Lembre-se que há alguns séculos não havia democracias e todos os países democráticos tiveram de superar obstáculos na sua história e tradição que eram avessos à democracia. Talvez isto seja mais difícil para umas culturas que para outras, mas nunca vi nenhuma que seja irremediavelmente incompatível com a democracia.

O senhor então é um otimista em relação ao processo de democratização do mundo? Ou a democracia liberal sempre será um ideal?

Sou otimista. Os últimos 25 anos do século passado foram muitos bons para o avanço da democracia, especialmente entre 1985 e 1995. Depois as coisas começaram a desacelerar um pouco e, nos últimos três ou quatro anos, segundo a organização Freedom House (que monitora a democracia no mundo), é possível ver uma ligeira erosão na democracia liberal, ou das liberdades, como eles chamam. Hoje creio que estamos em um período de estagnação em termos de progresso democrático, mas não percebemos uma reversão completa da democracia ou autocracia. Creio que nos próximos cinco ou dez anos não haverá grande mudança em qualquer direção. Mas em geral sou otimista em relação à democracia.

Em que estágio democrático o senhor avalia que o Brasil está? Ainda somos uma “democracia emergente”?

A palavra que os cientistas políticos usam para países que já fizeram a transição para a democracia é “consolidação”, o que reflete a ideia de que esse país ainda passará um período sob o risco de regredir e de que leva tempo para a democracia fincar suas raízes e as pessoas se acostumarem a ela. E em algum momento há uma conclusão de que um país se tornou uma democracia, se consolidou. Não conheço muito o caso brasileiro, mas estou inclinado a pensar que o Brasil não é mais emergente, mas sim perto de se consolidar. Minha única preocupação não é com a política doméstica do Brasil e sim com a postura do Brasil em relação à democracia em outros lugares, que não acho que tem sido construtiva.

O senhor se refere (à demonstração de apoio do Brasil) ao Irã?

Sim. Fiquei chocado com o que o presidente Lula disse em relação aos protestos iranianos e as eleições iranianas. Porque no Irã as pessoas estão lutando pela democracia, da mesma forma que fizeram os brasileiros 25 anos antes, entre eles o presidente.

Fonte: BBC Brasil, 7 maio 2010

Igreja e fundamentalismo midiático

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Quando ocorreram os ataques terroristas às Torres Gêmeas em 11 de setembro de 2001, nos EUA, o mundo descobriu que por trás do ato político extremado contra a maior nação capitalista do planeta escondia-se na nuvem de escombros um núcleo paramilitar organizado, de inspirações muçulmanas, denominado Al Qaida. Foi o suficiente para que a mídia norte-americana, apoiada nos relatos de uma dúzia de especialistas, pesquisadores, acadêmicos e afins, se debruçasse sobre as suspeitas de uma religião cujos ensinamentos de fé poderiam doutrinar seguidores de uma ideologia contra tudo que pudesse se referir ao estilo de vida ocidental. Entre uma oração e outra endereçada a Alá, possivelmente a intelligentsia ianque cogitava a hipótese de uma nova geração de assassinos em massa estar em plena nascente.

Tentou-se então, traduzir os hábitos exóticos dos seguidores do Corão e seus peculiares códigos de comportamento objetivando, quem sabe, a esclarecer supostas atitudes suspeitas em suas entrelinhas. Após utilizar uma lupa de alta resolução em suas conclusões, a mídia atestou, enfim, que as mesquitas não eram fábricas de terroristas e que, excetuando-se o uso de uma burka aqui, um shador acolá e o “estranho” dialeto, tudo estava como antes no quartel de Abrantes.

Ganância desenfreada

Quando ocorreram as denúncias envolvendo esquemas de charlatanismo, curandeirismo, extorsão e lavagem de dinheiro encabeçadas pela Igreja Universal do Reino de Deus, há alguns anos, o país descobriu que a sujeira debaixo do tapete foi descortinada mediante uma campanha de difamação envolvendo duas das mais poderosas emissoras de TV tupiniquins (Globo e Rede Record, essa última de propriedade da seita evangélica). A perda constante de audiência e de receitas publicitárias da Vênus Platinada para a concorrente motivou uma mobilização interna sem precedentes. Uma estratégia semelhante às mais eficientes táticas de guerrilha estava em curso: o uso do aparelho jornalístico da Globo que patrocinou investigações que possibilitaram desenhar a intrincada estrutura organizacional da igreja, dotada de um sistema de metas e resultados semelhantes às de qualquer empresa que tenciona recrutar novos talentos executivos.

Imagens em vídeo flagraram ações constrangedoras do seu líder, o bispo Edir Macedo, ensinando obreiros a mercantilizar a fé através de uma série de instrumentos de persuasão visando a doações cada vez mais vultosas. Tudo era estudado em minúcia para que os fiéis se conscientizassem, geral e irrestritamente, de que era chegada a hora de “comprar o seu lugar no céu”. O apogeu da guerra midiática ficou eternizado através de um close em que Macedo, debruçado sobre um montante de dinheiro após o término de um culto, sorri maliciosamente pela féria alcançada em pleno Jornal Nacional. Apesar de toda a turbulência generalizada, os evangélicos neopentecostais mantiveram sua crença inabalada em seu líder espiritual, mesmo com as evidências apontando a necessidade de uma intervenção imediata da justiça. A exposição pública desse fato produziu antipatias de toda espécie. Entretanto, são poucos os que hoje assumem a tese de que seus fiéis sejam também entusiastas de tamanha ganância desenfreada.

Prevenção para detectar predadores sexuais

Agora, o alvo da vez é a Igreja católica. As denúncias de redes articuladas de pedofilia envolvendo sacerdotes foram um prato cheio para a mídia. Os meios de comunicação cumpriram o seu papel em amplificar as notícias. O procedimento foi o mesmo dos dois exemplos citados acima: visar como alvo os pilares da instituição religiosa e provocar a já tão conhecida reação em cadeia polemizante. Especialistas, teólogos e afins foram pautados para lançar luzes, dessa vez, sobre a conduta sexual de padres que aliciavam coroinhas e seminaristas. O curioso nessa tragédia é que o celibato foi exposto na medina como uma aberração que não mais encontra eco na modernidade do século 21 e seria uma determinação antinatural a qual poucos sacerdotes estão psicologicamente preparados para exercer. A grita geral tendenciou para a revisão desse processo com a justificativa de que os abusos diminuiriam ou até cessariam.

Em primeiro lugar, há um problema de transtornos de sexualidade muito específicos – eu diria isolados – que norteia a grande maioria dos casos registrados. São patologias que, talvez, estejam enraizadas num período muito anterior a vocação sacerdotal. É verdade que esse psiquismo distorcido encontrou uma brecha para ser exercido em silêncio nas casas paroquiais, aproveitando-se de uma relação de confiança entre autoridade espiritual e seus pupilos. Mas, como fato inusitado, ganhou proporções alarmistas que não correspondem à realidade; os episódios começaram a ganhar contornos de uma epidemia iminente que não distingue inocentes de pecadores, além de estabelecer um postulado não oficial de vigilância sobre todos àqueles que se dedicam à evangelização cristã.

Em segundo lugar, a Igreja católica estabeleceu a figura do diácono, um sacerdote que recebe um ordenamento especial com autorização para celebrar grande parte de uma missa (excetuando-se a eucaristia, tarefa exclusiva dos padres) e que pode, inclusive, constituir família. Ou seja, viver em celibato ou ser um sacerdote religioso de outra cepa são escolhas distintas, não são decisões impostas para por em xeque os limites da sexualidade humana. Porém, assim como os psicólogos, policiais, artistas, jornalistas, advogados, engenheiros etc., os padres também necessitam estar sujeitos a uma avaliação periódica de sua psique por estarem expostos, às vezes, a tarefas que lhes exaurem as forças emotivas. Mas nem por isso tais avaliações periódicas são recomendadas com o único intuito de serem trabalhos preventivos para se detectar predadores sexuais.

Vícios de intolerância

Não tenho a cátedra e o espaço necessários para explicar contextualizações transcendentais que incentivem o ofício da fé. Porém, uma afirmação se faz urgente nesse momento: não podemos permitir que algumas maçãs podres contaminem todo um cesto de frutas. E o que dizer dos pedófilos não celibatários? Ter contato inesgotável com o mundo afora e acesso irrestrito às fontes de suas perturbações, mediadas principalmente pela internet, não parece fazê-los mais saudáveis perante o convívio social como bem exemplificam as outras dezenas de denúncias que surgiram. Permito abrir um parêntese dentro desse raciocínio e lembrar que a legislação trabalhista acerca do assédio sexual não foi formatada visando às agregações paroquiais.

Como consequência desse monitoramento excessivo, vem à tona uma versão reformulada da caça às bruxas. Repita-se: não se está condenando a apuração jornalística das denúncias. O rigor da responsabilidade civil precisa pesar sobre quem praticou essas insanidades. Entretanto, há danos quase irreversíveis que precisam ser avaliados com isenção. Talvez o maior deles tenha sido o estímulo de pré-julgamento depositado sobre grande parte da opinião pública disposta a comprar certas ideias baseadas no ódio puro e simples. Como argumentar, agora, com o inconsciente coletivo não católico que os celebrantes de uma liturgia com mais de 2 mil anos de tradição não são fornicadores sedentos em uma casa de swing clerical? Como argumentar que um abraço de um padre em um jovem crismando ou seminarista, em conclusão de seus estudos bíblicos, não configura subliminarmente um flerte erotizante?

É sabido que jornalismo e religião nunca se bicaram e não será hoje que o cessar-fogo vai se concretizar. Há sempre uma onda ciclotímica de patrulhamento, ainda que discreta, que recai sobre os praticantes de uma religião que declaradamente não se compactuam com os erros cometidos por seus líderes espirituais. O problema é que a narrativa jornalística muitas vezes não se cerca de sutilezas e os estilhaços de seu bombardeio moral não medem o tamanho das feridas que recaem sobre os que nada viram ou fizeram de comprometedor.

Judeus, muçulmanos, evangélicos, umbandistas etc. já tiveram que vir a público em determinadas situações para se eximir de culpas que não carregavam, algumas delas alimentadas por historiografias equivocadas e, mais uma vez, amplificadas pela mídia. Agora são os católicos que precisam carregar essa cruz. A outra face a ser dada por eles não é pela vergonha em se admitir que uma crise interna precisa urgentemente ser contornada, mas sim, pelos vícios de intolerância de certos meios de comunicação que não se incomodam em produzir a sua própria fogueira inquisitória onde pecadores e inocentes são carbonizados em praça pública.

Por Fabio Leon Moreira, no Observatório da Imprensa, 27 abr 2010