httpv://youtu.be/gujK5WEVG8g
Arquivo da tag: poesia
O Bicho Homem ~ poema de Francisco Carvalho, musicado por Raimundo Fagner
O BICHO HOMEM (Francisco Carvalho)
Que bicho é o homem, de onde ele veio para onde vai?
De onde ele veio para onde vai?
Onde é que entra, de onde é que sai?
Que raio lhe acende a chama da fúria
O que é que sobra da cesta básica de sua penúria
Que bicho é o homem, do que se enfeita que mão o ampara
No chão de enigmas em que se deita
Que bicho é o homem
Que mama no seio da reminiscência
E que embala a morte em seu devaneio
Que bicho é esse que carrega o fardo de uma dor medonha
Que sucumbe o fardo mas ainda sonha?
Que bicho vagueia na treva hedionda
Que pantera esguia será mais veloz do que a própria sombra? Continue lendo
Poesia da Criação ~ Cláudio Duarte
Em tempos de tantos ódios e fobias, deixo aqui registrada a beleza singela e bÃblica da poesia na criação.
httpvh://youtu.be/qzOnEBnHBfY
Os persas e seus nomes poéticos ~ Samy Adghirni
Poesia é coisa séria no Irã. Quase todo mundo sabe de cor um monte de versos, rodas de amigos adoram debater autores e um dos principais Ãcones nacionais é o poeta Hafez (1310-1390), cujo túmulo em Shiraz atrai romaria do paÃs inteiro. Hafez, aliás, era crente e capaz de recitar o Corão inteiro, mas celebrou em sua obra a embriaguez e o amor.
O gosto pela poesia parece ser um traço milenar da cultura persa, e até hoje pais dão aos filhos nomes, ou prenomes para ser mais exato, que são pura metáfora. Uns são bucólicos, outros românticos. Há também os metafÃsicos. É exemplo pra todo lado.
Tenho uma amiga que se chama Yeganeh (única no mundo). A irmã dela é Taraneh (canção). A chefe da agência Reuters no Irã leva o prenome de Parisa (aquela que é como uma fada). O da iraniana mais famosa do planeta, a ativista de direitos humanos e Nobel da Paz Shirin Ebadi, significa “doceâ€. Não confundir com “açúcarâ€, ou PanÃz, em farsi, como é chamada minha assistente. Simin, personagem principal do badalado e premiado filme “A Separaçãoâ€, quer dizer “aquela que brilha como prataâ€. Continue lendo
Yehuda Amichai: O lugar onde temos razão ~ por José Roberto Prado
Esta semana deparei-me com uma versão em Inglês de um poema de Yehuda Amichai denominado “The Place Where We Are Right” (O lugar onde temos razão)”.Â
Fascinado pela beleza do poema, ciente de minhas limitações e de que toda tradução é, em si mesma, uma interpretação, ofereço minha versão.  Logo abaixo seguem a versão em Inglês e o original em Hebraico.
Espero que aprecie.
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O lugar onde temos razão
Do lugar onde temos razão
jamais crescerão
flores na primavera.
O lugar onde temos razão
é duro e compacto
como um pátio.
Mas dúvidas e amores
escavam o mundo
como uma toupeira, como um arado.
E um sussurro será ouvido
nas ruÃnas
onde um dia houve uma casa. Continue lendo
Szymborska ~ José Miguel Wisnik
Não é o tema que faz a poesia, pois todo assunto pode resvalar para a bobagem, o sentimentalismo e o clichê
[OGlobo, 11 fev 12] Faço parte do clube dos amantes da poesia de Wislawa Szymborska. Uma senhora que até a semana passada vivia na cidade da Cracóvia. Não é fácil falar da poesia contemporânea, saber onde ela está, reconhecer o poeta em sua toca. De certo modo a toca é o lugar, escolhido e compulsório, de toda uma linha de poetas contemporâneos. A mercantilização das palavras, a sua apropriação publicitária, a identificação de tudo quanto existe pela sua senha utilitária, a mentalidade classificadora e redutora, a espetacularização da vida, a faccionalização dos discursos, são todos itens conhecidos, de certo modo batidos, mas verÃdicos, do mundo do qual a poesia tem que escapar, sabendo que isso é, no limite, impossÃvel. Drummond, por exemplo, acusou a vinda dessa onda avassaladora, a partir dos anos 1950. Além disso, a poesia autêntica está exposta necessariamente ao confronto silencioso e difÃcil com a pulsão de morte que o mundo contemporâneo manifesta por todos os poros e ao mesmo tempo esconde como nunca. Continue lendo
Hilda Hilst ~ Poesias
Carrega-me contigo. Pássaro-Poesia
Quando cruzares o Amanhã, a luz, o impossÃvel
Porque de barro e palha tem sido esta viagem
Que faço a sós comigo. Isenta de traçado
Ou de complicada geografia, sem nenhuma bagagem
Hei de levar apenas a vertigem e a fé:
Para teu corpo de luz, dois fardos breves.
Deixarei palavras e cantigas. E movediças
Embaçadas vias de Ilusão.
Não cantei cotidianos. Só te cantei a ti
Pássaro-Poesia
E a paisagem-limite: o fosso, o extremo
A convulsão do Homem.
Carrega-me contigo.
No Amanhã. Continue lendo
Sophia de Mello Breyner Andresen ~ Poemas
Sophia de Mello (1919 – 2004) foi sem dúvidas uma das poetisas lusitanas do século XX que emociona até hoje pela força da palavra. Sophia fez da palavra um outro viver no mundo, uma forma alternativa de vivenciar cada experiência e devolver a este mesmo mundo sua impressão.
As pessoas sensÃveis
As pessoas sensÃveis não são capazes
De matar galinhas
Porém são capazes
De comer galinhas
O dinheiro cheira a pobre e cheira
À roupa do seu corpo
Aquela roupa
Que depois da chuva secou sobre o corpo
Porque não tinham outra
O dinheiro cheira a pobre e cheira
A roupa
Que depois do suor não foi lavada
Porque não tinham outra
“Ganharás o pão com o suor do teu rosto”
Assim nos foi imposto
E não:
“Com o suor dos outros ganharás o pão”.
Ó vendilhões do templo
Ó construtores
Das grandes estátuas balofas e pesadas
Ó cheios de devoção e de proveito
Perdoai-lhes Senhor
Porque eles sabem o que fazem. Continue lendo
Louvação do Barro ~ Marià Manent
Cantarei o barro, porque nele esteve a vida
e este sangue que ferve em nosso corpo.
Meus olhos de barro pressentem o repouso
e o clarão imortal de uma outra vida.
Cantarei o barro porque foi amassada
a nossa carne do barro inconsistente
e na argila curtida e inanimada
o sopro de Deus entrou como a semente.
Tradução de João Cabral de Melo Neto
MARIÀ MANENT (1898-1988)
Rainer Maria Rilke ~ poesias
Rainer Maria Rilke, (Praga, 4 dez 1875 — Valmont, SuÃça, 29 dez 1926) foi um dos mais importantes poetas de lÃngua alemã do século XX.
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O tempo não é uma medida.
Um ano não conta, dez anos não representam nada.
Ser artista não significa contar,
é crescer como a árvore que não apressa a sua seiva e resiste,
serena, aos grandes ventos da primavera,
sem temer que o verão possa não vir.
O verão há de vir.
Mas só vem para aqueles que sabem esperar,
tão sossegados como se tivessem na frente a eternidade. Continue lendo
Guimarães Rosa: discurso em agradecimento ao prêmio de “Magma”
“O poeta não cita: canta.
Não se traça programas, porque a sua estrada não tem marcos nem destino.
Se repete, são idéias e imagens que volvem à tona por poder próprio, pois que entre elas há também uma sobrevivência do mais apto.
Não se aliena, como um lunático, das agitações coletivas e contemporâneas, porque arte e vida são planos não superpostos mas interpenetrados, com o ar entranhado nas massas de água, indispensável ao peixe—neste caso ao homem, que vive a vida e que respira arte.
Mas tal contribuição para o meio humano será a de um órgão para um organismo: instintiva, sem a consciência de uma intenção, automática, discreta e subterrânea. Continue lendo
Abujamra declama Guimarães Rosa
Quando escrevo, repito o que já vivi antes.
E para estas duas vidas, um léxico só não é suficiente.
Em outras palavras, gostaria de ser um crocodilo
vivendo no rio São Francisco. Gostaria de ser
um crocodilo porque amo os grandes rios,
pois são profundos como a alma de um homem.
Na superfÃcie são muito vivazes e claros,
mas nas profundezas são tranqüilos e escuros
como o sofrimento dos homens.”
Texto citado em entrevista a Giinter Lorenz, em janeiro de 1965, citado em “Uma cantiga de se fechar os olhos –“: mito e música em Guimarães Rosa – Página 74, de Gabriela Reinaldo – Publicado por Annablume, 2005